Reconciliação, justiça e perdão

“Quando os canhões estão retumbando, o Sermão da Montanha não permanece em silêncio”.

Dr. Rula Khoury Mansour

Meu coração dói devido ao imenso sofrimento e crueldade causados pela recente onda de conflito em minha terra natal. Na semana passada, no sul de Israel, testemunhamos um massacre realizado por militantes do Hamas que tirou a vida de mais de 1300 israelenses, incluindo mulheres e crianças. Mais de 100 foram sequestrados, e milhares foram feridos e deslocados. Em resposta, a guerra entre Israel e Hamas irrompeu, e a tragédia continua a escalar. No momento em que escrevo este artigo, como resultado do ataque da força aérea israelense na Faixa de Gaza, mais de 2.400 palestinos perderam suas vidas, com mais de 10.000 outros feridos. Milhares de casas foram destruídas, e mais de 600.000 civis estão deslocados na Faixa de Gaza. Entre as vítimas, muitas são mulheres e crianças. Israel impôs um ‘bloqueio total’ da Faixa de Gaza, bloqueando a entrada de alimentos, água, medicamentos, combustível e eletricidade. No entanto, é precisamente durante esses momentos caóticos que os seguidores de Jesus são chamados a refletir e falar. Como devemos responder e orar em tais circunstâncias?

 

Como um cidadão cristão palestino de Israel, eu lamento com todos aqueles que perderam seus entes queridos. Acredito que a violência, de qualquer lado, nunca é justificada. Como seguidor de Jesus, rejeito e condeno todas as formas de violência que levaram à perda de vidas, sofrimento e destruição; o dano duradouro supera em muito quaisquer benefícios temporários. O ciclo de retaliação e a mentalidade de ‘olho por olho’ apenas aprofundam o sofrimento e ampliam a divisão, criando uma barreira para a paz justa que tanto palestinos quanto israelenses merecem. É hora de passar de uma abordagem militar para uma solução política justa que atenda às preocupações de ambos os lados. Compreender a história do conflito israelense-palestino é crucial para compreender essas preocupações e as causas raízes da guerra atual. Muitos especialistas já abordaram este tópico extensivamente sob várias perspectivas. Diante de circunstâncias tão turbulentas e desafiadoras, quando os canhões ainda estão retumbando, senti uma necessidade avassaladora de revisitar nossa conduta ética em tempos de conflito. Desejo compartilhar minha perspectiva baseando-me na sabedoria atemporal do Sermão da Montanha.

 

Na semana passada, durante minha aula de Ética Cristã em Nazaré, entramos no mundo da sabedoria transformadora encontrada no Sermão da Montanha. Fomos lembrados por uma poderosa mensagem que tocou profundamente nossos corações: a poderosa resposta de Cristo à escuridão da violência e injustiça em seu tempo, impulsionada por um coração cheio de empatia e paixão pela justiça. Sua resposta rejeita tanto a violência quanto a retirada passiva das lutas do mundo. Em vez disso, Ele nos chama para uma jornada de reparação de relacionamentos quebrados. Começando com o mandamento ‘Não matarás’, Ele nos mostrou o caminho para restaurar laços danificados com as simples, porém profundas palavras: ‘Vá e reconcilie-se’. Ele desafiou a mentalidade predominante de ‘olho por olho’ nos instigando a oferecer a outra face, dar nosso manto e andar a segunda milha. Diante da adversidade, Ele nos ensinou a ‘amar o inimigo’, inspirando-nos a abençoar, De ‘Não matarás’ a ‘Vá e reconcilie-se’: Em meio a conflitos e guerras, essa iniciativa tem o potencial de mudar o curso dos eventos. Ela tem o poder de transformar a raiva e o ressentimento em compaixão e uma alma irada em um pacificador. Ela pega relacionamentos quebrados e os transforma em conexões pacíficas. Essa iniciativa nos convida a caminhar pelo caminho da graça, inspirado pela própria jornada que Deus fez em Cristo para reconciliar a humanidade. Então, quando nos encontramos em meio à raiva e à agitação, essa prática regular pode se tornar nosso farol de esperança, buscando acabar com o conflito e trazer uma paz duradoura. Não se trata de intenções vagas ou convicções elevadas; trata-se de práticas práticas e consistentes, um estilo de vida que, quando seguido fielmente, pode nos moldar em pacificadores e nos libertar dos ciclos destrutivos de raiva e vingança.

 

De ‘olho por olho’ a ‘ame seus inimigos’: O mandamento de Cristo para ‘amar o inimigo’ foi dirigido a um povo que vivia em um clima de violência e repressão. A maneira como amar os inimigos foi demonstrada tomou forma em quatro cenários que normalmente provocam o desejo de vingança: Primeiro, oferecer a outra face, onde usar a face direita para ser atingido com a mão esquerda simboliza um ataque fisicamente humilhante. Segundo, agressão ao tomar o manto ou posses de alguém, resultando em perda material. Terceiro, agressão à nossa liberdade, como visto na posição do soldado ocupante romano que subjugava e explorava outros para seu benefício. Quarto, extorsão e confisco do nosso dinheiro. Cristo afirmou Sua rejeição à vingança e resistência ao mal com mal abraçando a esperança e a crença de que o amor pode vencer o mal. Este caminho pode ser desafiador, mas é verdadeiramente admirável. É a essência do Seu sermão e o que distingue a ética cristã dos caminhos do mundo.”orar por e amar aqueles que podem parecer adversários. Este é o caminho atemporal de Cristo, conforme estabelecido em Mateus 5:21-48, para lidar com a injustiça e lidar com a violência.

 

A resposta de Cristo nos inspira e encoraja de três maneiras:

 

Primeiro, tome uma atitude: Em tempos desafiadores, temos a capacidade de iniciar soluções criativas. Cristo instou seus seguidores, muitas vezes aqueles que eram oprimidos, a rejeitar a vingança e explorar maneiras criativas além das respostas convencionais, oferecendo uma alternativa para lutar ou fugir. Essas iniciativas são transformadoras e visam afirmar a humanidade tanto do opressor quanto do oprimido, buscando uma transformação positiva em seu relacionamento. Gideão, observando a fome de seu povo, tomou uma atitude. Ele coletou e debulhou trigo secretamente em um lugar, escondendo-se do inimigo, para fornecer comida para aqueles que precisavam. Sua iniciativa é um poderoso exemplo de ações criativas e simples que trouxeram mudanças (Juízes 6:11-16).

 

Segundo, transforme Relacionamentos: Como pacificadores, nosso objetivo é provocar mudanças nos opressores expondo suas injustiças e persuadindo-os a mudar seus caminhos. Essa mudança em nossa abordagem nos afasta da busca por vingança e nos posiciona como instrumentos de Deus, defendendo a justiça e a paz através da compaixão. Virar a outra face (destacando a crueldade), andar a segunda milha (iniciando o diálogo) e entregar o manto (enfatizando a injustiça) não são atos de fraqueza, mas sim posturas heróicas. Eles servem para destacar a combinação de justiça e misericórdia expondo o erro e fomentando o diálogo, com a intenção de convencer os opressores a abandonar seus caminhos prejudiciais e abraçar os caminhos da verdade, abrindo assim a possibilidade de viver com dignidade e harmonia. Rizpa, que expôs publicamente a injustiça cometida por Davi contra seus filhos mantendo o fato da morte de seus filhos visível perante o povo de Israel por meses, fornece um poderoso exemplo de ação criativa que transforma relacionamentos com opressores (2 Samuel 21:1-14).

 

Terceiro, incorporar amor sacrificial e libertador: O exemplo de Cristo demonstra o poder do autocontrole e do amor. Seguindo Seu exemplo, podemos suportar o sofrimento sem buscar vingança e ver a injustiça como uma oportunidade para incorporar o amor e a justiça de Cristo enquanto trabalhamos para avançar Seu reino. Este amor é tanto sacrificial quanto libertador. Os quatro cenários (virar a outra face, dar seu manto, andar a segunda milha e dar ao que pede) incorporam este amor sacrificial e libertador. Em essência, o amor e a justiça são expressos através de um estilo de vida dedicado à conquista do mal com bondade. Eles nos guiam no crescimento em semelhança a Cristo e, no processo, na restauração de outros e da sociedade. A história do Bom Samaritano exemplifica o amor sacrificial e libertador. A instrução de Cristo para não resistir ao mal é sobre evitar a retaliação, mas não é um convite ao pacifismo em todas as circunstâncias. Em vez disso, é uma estratégia para prevenir a vingança e contribuir para a promoção do bem enquanto previne o mal.

A jornada de Martin Luther King Jr. exemplifica esses princípios. Ele suportou dificuldades, mas defendeu o amor sacrificial e libertador, liderando um movimento que libertou pessoas e alcançou vitórias notáveis. Enquanto estava na prisão, ele escreveu que o amor tem o poder de transformar um inimigo em amigo, pois tem o poder de redenção e o poder de criação. Ao abraçar esses ensinamentos, nós também podemos fazer a diferença em tempos de conflito.

 

Durante os primeiros dias da guerra, testemunhamos inúmeros casos em que indivíduos de ambos os lados do conflito optaram por não adotar a abordagem “olho por olho”. Em vez disso, eles escolheram amar seu inimigo. Por exemplo, Y, cuja esposa e filhos foram sequestrados pelo Hamas, rejeitou vozes de ódio e vingança de sua comunidade e enfatizou a importância de acabar com o cerco a Gaza para alcançar uma paz duradoura. Neta, cuja mãe foi sequestrada, pediu publicamente para não destruir Gaza e enfatizou a necessidade de uma paz justa para palestinos e judeus. Yosef, um cidadão israelense palestino, bravamente resgatou várias pessoas israelenses judias e evacuou outras para um hospital próximo em meio a um intenso fogo.

 

Essas vozes vão além das ações individuais. As igrejas palestinas em Israel/Palestina pediram orações, suplicando pela misericórdia de Deus, o fim desta guerra e o fim do conflito israelense-palestino. Algumas igrejas emitiram declarações para acabar com esta guerra e alcançar uma paz duradoura. Várias Igrejas Palestinas em Israel deram um passo adicional, incentivando seus membros a abrir suas casas para fornecer abrigo temporário e consolo para famílias necessitadas, além de estender ajuda a indivíduos afetados em Israel/Palestina. Ao lado delas, uma diversidade de organizações de base, abrangendo comunidades judaicas, cristãs e islâmicas, se uniu com um propósito comum: denunciar a guerra e a violência. Eles trabalham juntos para reduzir a polarização e o espectro de tensões crescentes que muitas vezes dominam as comunidades judaicas e palestinas. Acrescente a isso alguns jornalistas israelenses corajosos cujas reportagens expuseram injustiças. Seu trabalho serve como uma força para pressionar os líderes a abordar essas questões com justiça e integridade.

 

Essas vozes, defensoras da vida, empatia e paz duradoura, ofuscam aqueles que promovem morte, vingança e guerra. Eles incorporam um estilo de vida pacificador, promovendo ativamente a paz em meio ao conflito. Sua força reside na capacidade de vislumbrar uma rede de relacionamentos que inclui até seus “inimigos”, reconhecendo a interdependência e se comprometendo com o entendimento mútuo.

 

Inspirados pelo Sermão da Montanha e por inúmeras histórias de redenção onde as pessoas escolhem o amor em vez da vingança, que possamos nos tornar faróis de luz em meio à escuridão, defendendo a vida, expondo a injustiça e nos comprometendo com a paz duradoura. Que nosso amor tenha o poder de transformar nossos inimigos em amigos.

 

Por favor, ore conosco…

 

  1. Bondade Divina e Soberania: Confiamos na soberania completa de Deus sobre tragédias e injustiças, acreditando que Sua bondade garante que Ele está conosco em nosso sofrimento e trabalhará as coisas para Seus bons propósitos, e que em Seu tempo, Deus trará justiça e corrigirá todas as injustiças. Que possamos internalizar o fato de que Deus ter o controle final sobre todas as injustiças não nos isenta de nossa responsabilidade de sermos agentes de paz e justiça.
  2. Cessação da guerra: Oramos pela intervenção de Deus para parar o derramamento de sangue nesta guerra e proteger vidas inocentes em Israel, Gaza e nos territórios palestinos mais amplos.
  3. Reconhecimento do Sofrimento: Lamentamos e oramos por todos aqueles que estão de luto e sofrendo, tanto judeus quanto palestinos, por causa deste conflito contínuo. Que nossos corações estejam abertos para entender que nossa humanidade compartilhada diminui quando outros são humilhados e abusados.
  4. Cura e Conforto: Oramos por todos aqueles que foram afetados por este conflito, tanto judeus quanto palestinos, buscando cura, conforto e liberdade. Que eles encontrem consolo e paz em sua angústia, e que a presença amorosa de Deus lhes dê força e resiliência para superar o trauma. Conceda-lhes orientação, apoio e a assistência necessária para a recuperação e restauração.
  5. A Igreja: Senhor, conceda à igreja em Israel/Palestina a perseverança para seguir o caminho da graça, mesmo quando parece difícil, e quando a raiva e o medo ameaçam tomar conta. Que Seu amor seja nosso guia enquanto navegamos pelos desafios de nosso tempo. Ensina-nos a arte do amor que pode superar o ódio e promover a justiça. Lembre-nos de que nossa missão, como a missão de Jesus, envolve ser enviado ao mundo para amar, servir, curar, salvar e libertar, apresentando uma contracultura para que lutemos contra a vingança através da misericórdia/perdão e resistamos ao mal com o bem e busquemos justiça no caminho da reconciliação.
  6. Líderes e tomadores de decisão: Oramos para que Deus possa guiar os líderes e tomadores de decisão, concedendo-lhes sabedoria e coragem para buscar resoluções pacíficas duradouras. Que eles priorizem a unidade, o entendimento e o diálogo para acabar com o castigo coletivo e se concentrar na profunda necessidade de ambos os lados viverem em paz e segurança.
  7. Unindo-se pela Paz: Oramos pela proteção e força daqueles que estão se esforçando para construir pontes em meio ao caos; trabalhando juntos para prevenir a polarização e a escalada entre as comunidades judaicas e palestinas. Abençoe seus esforços e conceda-lhes sabedoria enquanto contribuem para promover a harmonia. Oramos pelo surgimento de pacificadores internacionais, que tenham sabedoria, compaixão e coragem para contribuir para uma paz justa e duradoura nesta região conturbada. Conceda-lhes discernimento para navegar nas complexidades deste conflito, empatia para entender o sofrimento de todos os lados, e determinação para superar divisões e promover reconciliação.

 

Que as igrejas em todo o mundo se juntem a nós na oração pela paz, demonstrando o amor de Cristo a todos os povos. Que nossas orações coletivas inspirem ações positivas e a busca pela paz duradoura.

 

Fonte: http://www.comeandsee.com/view.php?sid=1426&fbclid=IwAR3jrVzkSiujwhbS_otQr0kBJzyJ80vyhp5WVPesmBQm3C3pJXmd9zegMqI

 

 

 

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