Realidades Espirituais Budistas
O medo do mundo dos espíritos e do futuro
Alex Smith
Durante a Copa do Mundo no Brasil, em meados de 2014, adivinhos de todo o globo, inclusive da Ásia budista, tentaram predizer o vencedor por meio da observação de animais como o panda chinês, cães e até um polvo na Alemanha. Mas em nenhum lugar essa adivinhação é mais apaixonadamente ativa do que em Mandalay, Mianmar, tanto nas ruas como ao longo das subidas para os templos budistas no topo das montanhas próximas.
Uma necessidade universal percebida por todas as pessoas, de todas as sociedades em todo o mundo, é a questão de compreender o imponderável, descobrir o desconhecido e projetar o que não pode ser predito — especialmente no que diz respeito à morte e à orientação quanto ao futuro. Para ajudar companheiros budistas a responderem essas perguntas, existe uma pletora de adivinhos, médiuns, consultores/conselheiros e profetas e também monges budistas.
Medo do mundo dos espíritos e do futuro não é incomum na Ásia budista. Isso é ilustrado no seguinte relato da Mongólia registrado num boletim missionário de oração. Em agosto de 2014, um cristão nativo originário de Gobi-Altai proclamou o evangelho a seu povo. Ele havia sido “pastor de ovelhas, acreditando nas mesmas coisas em que aquelas pessoas acreditavam” (Stephens 2014, 1). Ele encorajou os novos crentes a serem batizados. Um ex-budista que dizia “ter desistido da adivinhação” (ibid.) ajudou a preparar um tanque batismal num pequeno riacho. O pai desse homem era um lama budista que ensinou ao filho os segredos da adivinhação como xamã. Formalmente, o filho não se tinha tornado um lama, mas ele praticava tão bem o trabalho xamânico que, de fato, seus companheiros pastores o consideravam um lama. Na noite anterior ao batismo, os missionários experimentaram “sonhos malignos assustadores” (ibid.). Na manhã seguinte, eles ensinaram acerca do Deus Criador, oraram e encorajaram os seguidores. Fazia dois anos que aqueles mongóis criam. Eles não haviam recebido nenhum outro ensinamento. Também não havia nenhuma igreja ainda. Naquele domingo, o ex-adivinho declarou que “não seria batizado porque não queria ofender o deus do rio ou o ‘deus do submundo’” (ibid.). Uma vez que sua esposa não tinha dormido bem, ela também tinha medo de ser batizada. Outro pastor declarou temeroso que “o pai dele se havia afogado naquele rio” (ibid.). Apesar dos temores reinantes, o evangelista mongol chamou os novos crentes para serem batizados. Um bom número de budistas do local sentou-se nas margens do riacho para observar. De repente, a esposa do ex-adivinho entrou nas águas decidida, seguida por duas outras mulheres e um homem. Esse tipo de tensão espiritual, medo, conflito e preocupação com consequências futuras é comum e típico, especialmente na Ásia budista.
Em princípio, Buda ignorava o mundo dos espíritos vividamente exposto na cosmologia budista. Ele cria que deuses, devas, espíritos, titãs e demônios tinham, todos, de passar pelo ciclo da vida (samsara) para vencer o karma em seu processo rumo ao nirvana. Entretanto, um diagrama birmanês de cosmologia budista de 1886 inclui um pavilhão de nats (espíritos guardiães, como o chao thí tailandês) e também o sol e a lua, indicando conexões astrológicas. Em torno do pagode budista Shwedagon há santuários para os nats e postos astrológicos auspiciosos para os dias planetários da semana. Como esse exemplo, em toda a Ásia, o budismo popular integrou o mundo dos espíritos em sua cosmovisão budista e práticas perenes. Isso não é diferente da Era das Trevas decadente na Europa na época de Calvino: “ a impiedade é tão perseguida, que quase nenhuma doutrina da religião ficou pura de misturas, nenhuma cerimônia livre de erros, nenhuma parte do culto divino, ainda que mínima, permaneceu não contaminada pela superstição” (Calvino 1976, 74-75).
No dia 18 de agosto de 2014, o programa GMT World News da BBC relatou sobre uma nova busca por um sino de um templo budista birmanês perdido no rio Irrawaddy, opaco e lamacento, perto de Yangon, em Mianmar. Produzido no século 15, o sino de 300 toneladas é reputado como o maior sino fundido do mundo. Ele afundou há uns 400 anos, quando era transportado numa balsa fluvial depois de ser tirado do famoso pagode de Shwedagon em Yangon. Infelizmente, o grande sino caiu da balsa, afundando nas profundezas pantanosas. Nesses anos todos, ninguém conseguiu localizá-lo. Na BBC, um xamã birmanês, refletindo a opinião dos monges, declarou a opinião comum deles de que “forças sobrenaturais do mundo espiritual budista estão impedindo a descoberta do sino” (BBC 2014).
Seja no passado antigo, seja em tempos modernos, a adivinhação, o discernimento e a determinação decisiva identificam e destacam a necessidade que os budistas sentem de projetarem o futuro. Ao mesmo tempo em que apresenta alguma discussão geral sobre as realidades e poderes espirituais, esta monografia vai se concentrar principalmente na discussão da adivinhação e nos meios afins para discernir o futuro.
Perspectivas antropológicas e culturais
A partir desse modelo em três níveis (religião – mágica – ciência), Paul Hiebert expôs sua teoria do meio excluído. Com frequência isso é um problema para missionários cristãos ocidentais cujas categorias etnocêntricas não coincidem com as do oriente, que em grande maioria reconhece a presença de espíritos. Desconsiderando a área central da mágica, eles percebem uma cosmovisão de ciência expandida com a religião por cima. Missiólogos efetivos levam mais em consideração o modelo tríplice de Hiebert quando trabalham com populações budistas. Especialmente nessa área da magia, a influência de realidades espirituais complexas afeta bilhões de budistas do planeta.
De certa maneira, as perspectivas budistas clássicas, particularmente entre monges no Sangha, são semelhantes ao modelo ocidental inadequado. Deuses, seres celestiais e realidades espirituais, inclusive poderes, principados e forças espirituais têm importância reduzida no ensino fundamental de Buda. Tudo é simplificado no karma como a causa de todos os efeitos em meio a uma total impermanência e vacuidade. Assim, essas realidades espirituais invisíveis são ignoradas ou consideradas inconsequentes, uma vez que, embora possam existir, ainda enfrentam múltiplas reencarnações até finalmente resolverem o karma para entrar no nirvana, um estado de não existência. Teoricamente, o budismo clássico adota uma cosmovisão moldada por uma pequena seção de ciência pragmática em baixo, com um grande bloco de religião acima. Entretanto, funcionalmente, endossa o princípio de assimilação para seus seguidores simples. Por conseguinte, o budismo incorpora miríades de crenças e práticas sobre espíritos dentro do budismo popular.
Uma vez que os missionários precisam proclamar Cristo de tal maneira que supra adequadamente as necessidades do coração, eles precisam considerar essas realidades dos espíritos dentro de culturas budistas nativas específicas para se comunicarem com eficiência. Ignorar conceituações espirituais na população alvo é desconsiderar as condições básicas e os meios estratégicos para alcançá-la. Os obreiros precisam falar ao centro do coração e tocar necessidades reais daqueles a quem tentam alcançar. Assim, se querem ser bem sucedidos na ajuda às comunidades deles, precisam compreender e manter contato com sua verdadeira cosmovisão. A melhor comunicação se fará por meio daquele mapa mental de realidades espirituais. Por conseguinte, é crucial observar e compreender as práticas diversas e os múltiplos praticantes que operam no mundo dos espíritos, qualquer que seja a cultura alvo.
Em Mágica, Ciência e Religião, o antropologista social Malinowski afirma que até mesmo os mitos, as lendas e o folclore não são meros produtos de eras passadas decadentes. Eles se renovam como forças vivas atuais de novas experiências e novos fenômenos. “A magia é a ponte entre a era de ouro de práticas primevas e o poder contemporâneo de realizar milagres” (1954, 83). Essas práticas longevas como leitura da sorte, adivinhação, predição e processos mágicos semelhantes empregados para projetar o futuro trazem novas esperanças aos devotos que dependem confiantemente deles. Esses tipos de predições podem variar de um povo para outro. Entretanto, muitas dessas práticas também contêm elementos em comum.
Papéis funcionais para fácil acesso ao mundo invisível são exercidos por uma pletora multicolorida de praticantes como sacerdotes, monges, xamãs, adivinhos, mágicos, sábios, videntes, profetas, curandeiros, médiuns, incluindo-se os que fazem psicografias, leem sorte, cristais ou cartas de tarô, etc. Estes são usados para determinar o futuro e prever resultados proféticos. Às vezes eles identificam causas malignas para tragédias, fracassos, derrotas e eventos trágicos no passado. Os médiuns tendem a proliferar entre os budistas o comércio de predições do futuro e de certezas do que está por vir. Um veterinário provincial tailandês que vivia perto de nós considerava expandir seu negócio de frangos. Ele pediu ajuda do adivinho para determinar se o governo iria transferi-lo para outra província dentro de dois anos. O vidente disse que ele seria transferido logo, de modo que ele não expandiu os negócios. Na realidade, ele permaneceu na província muitos anos, mas o medo do futuro predito afetou nitidamente sua decisão.
A Wikipédia alista um autêntico dicionário de mais de quarenta termos variados, com múltiplas práticas usadas na adivinhação. [1]Entre as diferentes práticas para realizar essa adivinhação estão orações feitas em santuários sagrados, altares ancestrais, pilares da cidade e wats (templos) budistas. Os médiuns também transferem poder para amuletos, cordões, água, roupas, imagens e vários objetos com forças espirituais para ajudar a proteger, curar e dar vantagem sobre forças malignas e futuros inimigos. Eles também infundem esses poderes nos devotos por meio de tatuagens e dispositivos defensivos implantados como talismãs, tudo para preservar e proteger de futuros ataques à vida dos devotos.
A adivinhação costuma tornar-se crucial quando uma família está lidando com a morte de um ente amado. Os médiuns falam com o morto ou com outras forças espirituais das trevas. Alguns são voluntária ou involuntariamente possuídos por poderes demoníacos. Essas forças espirituais os ajudam a realizar coisas extraordinárias ou miraculosas, como andar sobre o fogo ou perfurar o próprio corpo com espadas e facas sem sentirem dor. Outros consultam espíritos antigos ou ancestrais (necromancia) para obter orientação ou predição do futuro. Alguns chegam a produzir e interpretar sonhos e visões, antevendo tempos futuros. Projeções da consciência e invocações de almas ou espíritos dos ameaçados ou perdidos também são praticadas para estender as perspectivas de saúde e vida.
Mongólia: exemplos de adivinhação
Os múltiplos métodos de adivinhação na Mongólia ilustram essa complexidade. Em resposta a minhas perguntas a respeito dos métodos de adivinhação mongóis, Bill Stephens, obreiro veterano fluente em mongol e com duas décadas de experiência tanto em contextos rurais como urbanos, respondeu com dados valiosos e interessantes. Sua resposta sobre quem faz adivinhação foi: “Lamas budistas, adivinhos e mulás islâmicos (para as minorias muçulmanas, os cazaques e khotons)” (2014:1). A Bíblia, em que o islamismo, judaísmo e o cristianismo se fundamentam, proscreve a adivinhação e todas as formas de feitiçaria. Na vida real, porém, os seguidores dessas religiões, muitas vezes em segredo ou mesmo abertamente, participam dessas práticas ocultas na Mongólia, do mesmo modo que a população budista em todo o mundo.
A adivinhação é praticada na Mongólia e em outros lugares em primeiro lugar “com propósitos de prosperidade, saúde e riqueza” (ibid. 2014.1). Especialistas adivinham o futuro (pelos motivos acima), o passado (por que essa pessoa morreu? ou por que esse acidente aconteceu? etc.) e o presente (decisões sobre mudar ou não, conseguir promoções, como prosperar, ser saudável ou ficar rico).
As pessoas consultam lamas antes de tomar decisões, “para saber o que vai acontecer” (ibid.). Eles também o fazem para localizar “gado ou coisas perdidas”. Com frequência eles adivinham usando “21 pedras” (Stephens 2014:1). John Hare, fundador da Fundação de Proteção do Camelo Selvagem, ilustra esse uso das 21 pedras. O último parágrafo de seu artigo sobre camelos bactrianos selvagens observa: “Um de nossa equipe ficou perdido durante a noite nas Montanhas Atis, uma experiência não agradável quando há lobos uivando e a temperatura está batendo 15 graus negativos. Nosso guia mongol nos garantiu, usando 21 pedras, que ele acabaria voltando ileso (o que aconteceu)” (Hare 2014, 1).
O blog Under Mongolian Blue Sky [Sob o céu azul mongol] publicou um artigo “Mongóis e a morte” que descreve adivinhação em relação à morte em uma família:
Decidi perguntar a meu professor mongol acerca do que acontece quando alguém morre na Mongólia, i.e., quais são os costumes seguidos pelas pessoas. Os mongóis em geral detestam falar da morte . . . Ele me disse que quando a pessoa morre, ela é levada imediatamente para um lama. Entretanto, não é a qualquer tipo de lama. É um tipo especial de lama chamado youm gedeg khoong. Literalmente, isso significa “pessoa que vê coisas”. A família traz o recém-falecido ao lama que adivinha as vidas passados dele, etc. O lama, então, instrui a família sobre quando e como a pessoa deve ser sepultada, e.g., em que direção e com quais objetos . . . Depois, enquanto a família aguarda o tempo especificado, que pode ser um dia de número ímpar, eles se reúnem para se visitarem mutuamente, expressar as condolências e preparar a comida e comer. É tabu dizer o nome da pessoa que faleceu recentemente (2006:1).
Os mongóis e outros povos budistas na Ásia Central também se referem à “abertura da caixa de ouro” — receptáculo mágico da vida, baseado em um sutra budista. Stephens escreve: “Os lamas realizam uma cerimônia que não vi, só ouvi falar, chamada ‘abertura da caixa de ouro’, para determinar onde a pessoa está depois de morta” (2014:1). É interessante que James Frazer em O Ramo de Ouro conta vários contos míticos mongóis acerca da urna ou recipiente de ouro em que a alma é mantida. Durante o combate mortal, o herói não pode matar seu oponente mesmo depois de um longo período de batalha, até encontrar onde reside sua alma — em geral dentro de algum receptáculo ou animal guardado na caixa de ouro. Quando o herói abre a urna ou caixa de ouro e mata os animais que contêm a alma do inimigo, este morre instantaneamente (1951, 782-783). Manduhai Buyandelger numa seção intitulada “Uma morte inesperada e o mistério da caixa de ouro” detalha um longo relato do que se segue à morte de Bat, irmão de Baasan. Certa manhã, ainda cedo, em outubro de 1998, o corpo de Bat foi encontrado num pasto entre seu ger (tenda forrada de feltro, yurt em russo) e o de um amigo a quem havia visitado no dia anterior. Nem a polícia nem os médicos conseguiram encontrar o motivo de sua morte. O homem de quarenta e cinco anos “não tinha nenhum problema no coração, nenhuma ferida, nenhuma hemorragia interna” (2013, 235). Suspeitando que a morte de Bat podia estar relacionada à sua iniciação como xamã dois meses antes, Baasan procurou “os serviços de adivinhação dos lamas budistas” como fazem todos os mongóis durante os rituais fúnebres (2013, 236).
Chamada “a abertura da Caixa de Ouro”, essa prática envolve recuperar informações de um sutra intitulado “A Caixa de Ouro” e mapear a trajetória da vida e pós-vida da pessoa conforme dada pelo Burhan Bagsh (o Mestre Buda). Baseado nessa informação, o adivinho avisa aos sobreviventes o curso da reencarnação e da próxima vida do familiar falecido. As observações escritas baseadas na Caixa de Ouro devem ser sepultadas com o morto (2013, 236).
No fim os lamas apresentaram três causas a Baasan: primeiro, a alma de Bat já havia deixado o corpo um ano antes de sua instalação como xamã; segundo, embora um xamã tivesse propiciado os espíritos de sua família de origem, os espíritos de origem continuaram negligenciados, uma vez que nenhum ritual os alcançou; terceiro, Bat usou um nome inadequado (2013, 236). Baasan passou os dois anos seguintes consultando lama após lama, xamã após xamã para tentar descobrir a causa da morte prematura de seu irmão, sem nenhuma resposta satisfatória.
Charles Bawden, professor de mongol na Universidade de Londres (1955-1984) e compilador de um dicionário mongol – inglês, publicou uma história da caixa de ouro que tinha um contexto não só de receptáculo de alma, como também um elemento profético de adivinhação. Ele reconta uma lenda folclórica mongol de um lenhador com dois filhos chamados Alegria da Escritura e Alegria da Joia. Um dia os filhos estavam fora, cortando lenham mas voltaram sem nada. Quando o pai perguntou por que não haviam trazido nenhuma lenha aquele dia, eles explicaram que tinham encontrando uma grande árvore nodosa vermelha e passaram o dia inteiro tentando arrancá-la. Ela se mexia, mas eles não conseguiram tirá-la. No dia seguinte o pai foi junto com eles com uma grande corda de couro e conseguiram arrancá-la. Eles viram um grande buraco escuro onde estava a árvore e descobriram uma caixa de ferro no fundo. Nessa caixa estava uma caixa de prata e nela uma caixa de ouro. Quando abriram essa caixa de ouro, encontraram um galo branco de cabeça verde que o pai levou para casa (2003, 334).
Depois de alguns anos, a mãe morreu e foi sepultada onde estivera a grande árvore nodosa vermelha. O homem tomou outra esposa que tinha um lama que seria seu lama-travesseiro (talvez um espírito familiar). Quando o pai caiu doente e estava para morrer, ele pediu aos filhos que fosse sepultado junto da mãe deles, que festejassem por três dias e noites e depois comessem o galo branco com a preciosa cabeça verde. Logo antes de comê-lo, deviam colocá-lo na última arca, reverenciá-lo três vezes e este cantaria três vezes. Então o pai profetizou que aquele que comesse o cérebro viria a ser khan; o que comesse o coração e a artéria principal seria um dos Quatro Oficiais do Reino. O pai, então, lhes disse que seguissem rumo ao noroeste onde encontrariam muitas tendas pretas. Ele alertou para que não entrassem nelas, mas que seguissem até encontrarem uma única tenda branca. Ele lhes deu um enigma profético dizendo: “Se cumprirem os interesses dos outros, os seus interesses serão cumpridos” (2003, 335). Então morreu e foi sepultado no túmulo da esposa. Os filhos continuaram vivendo com a madrasta.
Um dia, lembrando que o pai havia deixado um galo especial para eles, ela consultou seu lama-travesseiro, perguntando como deviam comê-lo. O lama disse que ela podia ficar doente. Depois ele predisse que se ela comesse o galo, ela se recuperaria. Logo ela caiu doente e os filhos concordaram que ela podia comer o galo e com isso se recuperar. A madrasta e seu lama-travesseiro realizaram a festa e, antes do fim, Alegria da Joia seguiu as instruções do pai sobre o galo branco com a preciosa cabeça verde. Os dois filhos saíram rumo ao nordeste. Depois de um tempo passaram por muitas tendas pretas e mais tarde entraram na tenda branca, onde residia uma mulher solitária que não tinha filhos. Ela os beijou e os convidou para entrarem em sua tenda onde havia dois conjuntos de almofadas, pratos com comida e chá em duas mesas. Ela havia pedido filhos a um lama e ele lhe disse que seus dois meninos chegariam do Leste. Eles concordaram em serem seus filhos e permaneceram felizes com ela.
Esse conto folclórico torna-se então um tanto longo, complexo e complicado, recheado de alusões ao budismo. Quando Alegria da Escritura chegou à idade de se casar, essa mãe arranjou para conseguir de um casal a mão da filha deles. Em troca, eles pediram quatro coisas: uma joia de cristal de rocha do tamanho da cabeça de um cavalo, uma joia de bronze do tamanho da cabeça de um homem, mais lingotes de ouro e prata. Depois de alguma discussão Alegria da Joia saiu para consultar um lama sábio no norte. Ele levou só uma bacia de grãos e um pilão de ferro. No caminho, ele primeiro encontrou formigas brigando e devorando umas às outras. Ele espalhou seus grãos sobre elas e todas elas seguiram em paz para o ninho, cada uma com seu grão. Em seguida ele encontrou uma cobra tentando comer porcos. Ele atacou a cobra com o pilão e os porcos escaparam. A cobra lhe pediu que perguntasse ao lama sábio por que ela sofria tanto por tantos anos. De modo semelhante, ele passou por uma árvore seca, depois por um peixe cujas costas tinham sido comidas por vermes e, por fim, por um lama que havia conhecido dias melhores. Todos eles lhe pediram que apresentassem suas perguntas ao lama sábio.
Quando encontrou o celebrado lama, a multidão disse que estava esperando o dia seguinte para se aproximar dele. O lama também disse que só podiam fazer quatro perguntas. Alegria da Joia tinha um dilema e um enigma porque havia quatro perguntas próprias e quatro outras, por procuração, da cobra, da árvore, do peixe e do lama. O que devia perguntar? Ele resolveu perguntar as dos que encontrou pelo caminho. O lama sábio respondeu uma por uma, dizendo que as respostas estariam perto de cada um, à sombra da própria cabeça deles. Se cavassem ali seriam libertados e restaurados. À sombra da cobra estava um lingote de prata; à da árvore, um lingote de ouro; à do peixe uma joia de bronze do tamanho da cabeça de um homem; e à do lama, por fim, um cristal de rocha do tamanho da cabeça de um cavalo! Quando ele relatou isso a cada um, eles responderam que ele podia cavar e guardar o que encontrasse, uma vez que havia encontrado a resposta deles. Assim, Alegria da Joia voltou para os pais da noiva pretendida com os bens requeridos. Ele se lembrou da promessa profética do pai: “Se você cumprir os interesses dos outros, os seus vão se cumprir” (2003, 335).
Porém os pais aumentaram as exigências e haviam misturado um alqueire de grãos com um alqueire de areia. Eles lhe disseram que os separasse. Ele começou, mas logo caiu no sono. Quando se despertou, as formigas haviam separado em duas pilhas sobre feltros. Os pais então disseram que ele precisava cavar um buraco que atravessasse a montanha ao norte. Depois de fazer um X em cada lado da montanha, ele caiu no sono. Os porcos vieram e cavaram o buraco na montanha. Assim, ele conseguiu uma noiva para o irmão mais velho. Ela também tinha um lama-travesseiro que a aconselhava. Isso criou problemas para ela e para o marido. (Aqui resumimos a história.) Mas a calamidade foi revertida e eles tiveram felicidade e prosperidade como antes. No devido tempo o velho khan enviou mensagens para entronar Alegria da Joia como o novo khan, enquanto Alegria da Escritura tornou-se um dos Quatro Oficiais do Reino. E todos viveram felizes para sempre (Bawden 2001. 333-340).
A possessão xamânica é outra forma de adivinhação mongol. Muitos xamãs são budistas, mas também utilizam práticas mais animistas. Stephens as descreve:
Os xamãs também adivinham, mas são diferentes. Eles não usam pedras nem dados, nenhum instrumento. Eles são possuídos por um ongon ou espírito ancestral. Mas para serem possuídos usam roupas especiais, talvez de pele de cervo, e batem um tambor especial com uma baqueta especial. Ás vezes também bebem vodca (2014, 1).
Os xamãs entram em êxtase e estado de transe. Deemer escreve que os xamãs são “místicos que se escondem nas montanhas, migrando com rebanhos de renas, caindo em transe, canalizando espíritos, predizendo o futuro — mudando o futuro” (2009, 1). O xamã pode ser homem ou mulher. Basicamente, são médiuns entre dois mundos: o mundo físico observável embaixo e o mundo espiritual invisível acima. O uso de tambores é típico dos xamãs, assim como a telepatia se encontra em outros budistas e médiuns tribais.
Os mongóis seguem o budismo tibetano. Monges budistas tibetanos combinam cânticos monótonos de encantamentos musicais ou versos, batidas de tambor, toques de trompa dungchen, gongos e címbalos tingsha para invocar ou afastar os espíritos em liturgias, cerimônias ou rituais. O efeito da combinação de sons é o condicionamento dos ouvintes. Uma forma tibetana de adivinhação também usa ossos e crânios humanos (yama, crânios inteiros decorados, ou kapala, calotas cranianas). O uso desses crânios sagrados inclui retirar a maldição de uma família, oferecer alimento e vinho aos deuses, guiar uma alma desviada para o caminho certo, ajudar a alcançar iluminação e realizar rituais de empoderamento (Science 2012, 2).
Stephens mencionou outro método ímpar de adivinhação. “As pessoas também lançam shagai, ossos do calcanhar de carneiros ou bodes” para adivinhar (2014, 1). Shagai são tálus ou artelhos. O adivinho lança quatro shagais. A posição de cada um determina o futuro. Algumas pessoas comuns também os usam para vários jogos, o que equivale a ler horóscopos. Shagai é um método popular para leitura da sorte na Mongólia.
“Dados também são usados pelos adivinhos” (2014, 1). Ler a sorte é predizer informações sobre a vida e o futuro da pessoa. Em princípio é similar à adivinhação, com uma diferença. A adivinhação é usada para predições em geral relacionadas com rituais religiosos ou invocação de deidades ou espíritos. A leitura da sorte, pelo menos no Ocidente, é menos formal ou séria. É mais um tipo de cultura popular em que, muitas vezes, a crença em operações ocultas não é considerada com muita seriedade. Entretanto, para os povos do Oriente, a leitura de sortes torna-se uma empreitada e atividade séria.
Poderíamos discutir muitas outras formas de adivinhação na Ásia, entre budistas de várias nações, mas dificuldades de espaço exigem que a exploração cultural termine aqui. Agora vamos considerar questões bíblicas a respeito do assunto.
Análise bíblica da adivinhação, discernimento e determinação
Deus prometeu a Abraão e a seus descendentes que se o seguissem de todo o coração, ele os guiaria pessoalmente e os dirigiria rumo ao futuro. Apesar de experimentar várias vezes o livramento miraculoso do Egito e sua preservação e provisão fiel durante quarenta anos no deserto, Israel se rebelava com frequência. Eles se esqueciam das conquistas vitoriosas sobre as nações corrompidas do Levante. Eles rejeitavam habitualmente o reinado de Deus, voltando-se para cultos profanos de imagens esculpidas, ídolos e os deuses falsos das nações gentias à sua volta. Eles cometiam imoralidades crassas em adultérios espirituais, sociais e físicas, incluindo-se prostituições cultuais em lugares altos e no Templo do Senhor.
Por conseguinte, o julgamento divino recaiu sobre Israel, afetando dramaticamente o futuro deles. Deus escondeu sua presença prometida na glória do Shekinah, permitiu que forças estrangeiras vencessem os exércitos de Israel, entregou a Arca da Aliança nas mãos dos inimigos e permitiu que nações estrangeiras controlassem sua terra prometida. Esses inimigos destruíram seu santo templo e profanaram sua santa cidade de Jerusalém. Eles levaram sua nação santa para o cativeiro e deixaram sua terra desolada. Por trás da rebeldia de Israel e das ações inimigas estavam realidades espirituais poderosas, tanto humanas como espirituais, principados, autoridades e poderes, como o Príncipe da Pérsia (Dn 10.12-13). Arcanjos, como Miguel e Gabriel, contra-atacaram. De modo significativo, esses confrontos estavam relacionados ao futuro de Israel (Dn 10.14). Batalhas celestes afetaram os eventos futuros sobre a terra. Entretanto, as promessas de Deus para o futuro último de Israel permaneceram firmes.
A Bíblia contém causas tanto positivas como negativas para predições, sejam passadas, sejam futuras. Meios miraculosos de orientação, como o pilar de fogo à noite, a nuvem durante o dia, a sarça ardente de Moisés, a vara de Aarão, foram reconhecidos e seguidos. Equipamentos especiais como terafins, éfodes, urim e tumim eram usados religiosamente junto com orações especiais para discernir resultados futuros. Entendidos utilizavam esses itens especiais para encontrar a vontade de Deus para vitória futura ou para revelar causas de problemas e fracassos passados. Os profetas, sacerdotes e príncipes de Israel desvendavam o futuro para Israel. Alguns eram genuinamente inspirados por Deus, outros eram falsos. O discernimento de ações futuras seguia métodos prescritos por Deus e usava vários instrumentos.
Os terafins tinham dois usos: deuses domésticos (Gn 31.34) e ídolos de rituais de cultos em templos (JVL 2012, 1-2). Esses talvez fossem “sobreviventes de um culto primitivo ancestral” que se tornaram “mais tarde um tipo de oráculo de Manes” (JE 1906, 8). “Os terafins eram empregados para adivinhação no período dos juízes (17.5; 18.17) e, como o éfode de adivinhação, foram mais tarde condenados por Josias (2 Rs 23.24). Samuel comparou a rebelião de Saul à iniquidade, adivinhação e idolatria (1 Sm 15.23; JE 1906, 2). A função mais importante dos terafins era a adivinhação, “principalmente para propósitos oraculares”, provavelmente em conexão com o “lançamento de sortes sagradas” (JE 1906, 7).
Os éfodes tinham dois significados: uma vestimenta usada pelo sumo sacerdote e uma imagem (JE 1906, 6-7). Gideão tomou os brincos de ouro dos midianitas para fazer um éfode (Jz 8.24-27). Juízes 8.27 “descreve claramente um éfode como um objeto empregado em adivinhação” (JE 1906, 7-8) e “o oráculo sagrado” (JE 1906, 7), indicando “uma imagem portátil diante da qual se lançavam sortes” (JE 1905, 8).
O urim e o tumim eram “instrumentos sacerdotais para obtenção de oráculos” (JVL 2012, 1) “um dos três meios legítimos para obtenção de oráculos nos primórdios de Israel” (JVL 2012, 1): urim, sonhos, profetas (1 Sm 28.6). Eles se extinguiram depois da queda de Jerusalém ou do primeiro exílio. Talvez fossem um tipo de sorte (pedras ou varas), como o lançamento de sortes (Is 34.17; 1 Sm 10.20; JVL 2012, 2). Eram objetos ligados ao peitoral do sumo sacerdote (peitoral de julgamento) e usados como um tipo de oráculo divino. Dois podem ter representado “revelação e verdade” ou “luzes e perfeições” (JE 1906, 6-7). Números 27.21 indica que “Josué e seus sucessores só podiam falar com o Senhor pela mediação do sumo sacerdote e por meio do umim e do tumim” (JE 1906, 7). O consenso geral sustenta que isso envolvia alguma forma de lançamento de sortes (cleromancia) para determinar as questões (Wikipédia 2014, 1).
O lançamento de sortes era usado com frequência no Antigo Testamento para discernir a direção, escolha e vontade de Deus. Aarão lançou sortes usando dois bodes representando Jeová e o bode expiatório (Lv 16.8). Acã foi revelado como a fonte de pecado mortal, provavelmente pelo uso de algum tipo de sorte (Js 7.14s). Para dividir a terra, lançaram-se sortes diante do Senhor (Js 18.6). Pelas sortes lançadas pelos marinheiros, Jonas foi identificado como o responsável pela tempestade violenta (Jn 1.7). Hamã lançou sortes para determinar o dia futuro para destruir os judeus em Susã (Et 3.7). O Novo Testamento registra a profecia cumprida pelos soldados romanos que lançaram sortes pelas vestes de Jesus (Sl 22.18; Jo 19.24). Depois de observar as Escrituras e orar, os apóstolos lançaram sortes para escolher um substituto para Judas Iscariotes (At 1.15-26).
Daquele ponto em diante, o Novo Testamento em geral passa a depender da oração em lugar das sortes. Os evangelhos e Atos ainda apresentam palavras proféticas, sonhos, visões, aparições e palavras de anjos. Mas, cada vez mais, a direção do Espírito Santo mediante consequente convicção interior, juntamente com o senso comum santificado parecem ter se tornado o meio principal para discernir o futuro (At 16.10).
Satanás predisse o futuro para tentar Adão e Eva. “Vocês serão como Deus” (Gn 3.5). Ele usou a mesma tática para tentar Cristo. “Tudo isto lhe darei, se…” (Mt 4.9). Adão rejeitou a palavra de Deus, Cristo lembrou-se da palavra de Deus. O foco no futuro estende-se do Éden ao Armagedom, de Gênesis a Apocalipse. Uma preocupação semelhante de discernir o futuro afeta os budistas.
Crenças e práticas observadas pelos budistas
A professora chinesa Zhou Qi iniciou em 2009 um projeto de pesquisa sobre Adivinhação na Teoria e Prática Budista. Nessa rara análise das predições no budismo chinês, seu propósito é “demonstrar como o budismo na China explica e pratica a predição” (2012, 1-2). Ela afirma: “É amplamente reconhecido que as principais teorias do budismo se opõem a tudo o que diz respeito à predição ou augúrio, embora haja alguns clássicos budistas que de fato mencionam ou dão alguma explicação acerca da predição” (2012, 2). Ela observa que a disciplina budista proíbe que entendidos e fiéis façam predições ou augúrios, mas na realidade eles “sempre estiveram presentes” (2012, 2). O sistema doutrinal budista é baseado na “teoria do karma, cuja lógica determina que as teorias budistas se opõem de maneira generalizada ao augúrio ou predição” (2012, 2). Entretanto, “de fato existem doutrinas que não só tentam explicar o desconhecido, como também fornecem predições e até pressuposições acerca do futuro” (2012, 2). Ela alega de forma perspicaz que a lei da causalidade é inerente às duas teorias budistas fundamentais da pratitya-samutpada (origem dependente) e do karma. Assim ambas, ainda que neguem a predição ou augúrio, “estão, elas mesmas, fazendo a predição” (2012, 2).
Alguns eventos premonitórios cercaram o nascimento de Sidarta Gautama que mais tarde ficou conhecido como o Buda ou o Iluminado. Sua mãe, Rainha Maya tinha feito um voto de castidade. Mais tarde ela teve um sonho em que um elefante branco, entrando pelo seu flanco, a engravidou miraculosamente. O famoso vidente Asita havia predito trinta e dois sinais (lakshanas) ou marcas distintivas que identificariam o Buda em seu nascimento. Alguns desses eram um tanto fantasiosos, como símbolos das rodas do cakra nas solas dos pés e luz irradiando dos poros de sua pele. Igualmente, alguns aspectos físicos eram extraordinários, como quarenta dentes, dedos dos pés e das mãos ligados por uma membrana e o corpo dourado. Na cerimônia para dar um nome a Sidarta, sete sacerdotes brâmanes levantaram dois dedos, inferindo que ele seria um grande rei e um Buda. Um sacerdote chamado Kondanna discordou e levantou só um dedo, com isso predizendo veementemente que a criança só seria um Buda, um mestre religioso, jamais um rei.
Depois de sua Iluminação aos trinta e cinco anos, Buda parecia ignorar a adivinhação, uma vez que toda a vida e os elementos era imateriais, irrelevantes, ilusórios, não permanentes e sempre mutantes. Ele propôs e ensinou que só a percepção interior, juntamente com a obtenção do nirvana, era todo o alvo e resposta para o karma no intuito de vencer o sofrimento passado e as múltiplas existências e, acima de tudo, escapar ou ser livrado de existências e vidas futuras (Dhammananda 1998, 24). Em termos gerais, portanto, adivinhar o futuro era fútil e confiar na predição do que estaria à frente seria irrelevante, porque tudo era produto do karma da pessoa. O karma para o futuro não podia ser predito porque deriva das obras boas ou más e das ações positivas ou negativas intencionais da pessoa.
Em Bodh Gaya, onde Sidarta Gautama foi iluminado durante a lua cheia, ele teve percepções significativas em três noites sucessivas. Na primeira noite, Buda viu cem mil de suas existências ou renascimentos anteriores, todos produzidos pelo karma; na segunda, os quatro estágios do ciclo de vida pelo qual todos os seres sensíveis passam de acordo com seu karma: nascimento, doença, velhice e morte; no terceiro, as Quatro Nobres Verdades, incluindo o Caminho Óctuplo, pelas quais a pessoa pode no futuro ser liberta da ignorância, da vacuidade e do inevitável ciclo da vida. Nenhuma outra provisão foi predita.
Uma predição posterior interessante de Buda quanto ao futuro do budismo é observada no Vinaya Pitaka (II, 253ss), a saber: se as mulheres fossem admitidas na vida monástica (Sangha), então o budismo seria abreviado a apenas 500 anos (Buddhanet, 15), em vez de 5.000. Isso se comprovou inválido.
Outra previsão importante de Buda projetava que o Buda Maitreya o seguiria no futuro, depois de passados muitos kulpas, quando o Dharma estivesse totalmente esquecido. Maitreya, atualmente no Céu Tusita, é o único Bodisatva reconhecido nas duas tradições: Teravada e Mahayana (Manjushri 2013, 1).
Alguns intérpretes japoneses modernos do Sutra da Flor de Lótus da Lei Maravilhosa veem uma predição na afirmação de Buda Shakyamuni: “Vocês são budas”, como cumprimento futuro de aspirantes a budas. Esse sutra também anota futuros diabos e seus atos diabólicos (Kosei-kai 2009, 1-2). Ehi Passiko explica que em Anguttara Nikaya 7.66 (2) do Tripitaka, Buda predisse o fim do mundo com alguns detalhes elaborados, inclusive o surgimento de sete sóis em torno da terra — uma causa para alerta contra o aquecimento global e, por fim, a desintegração total da terra e do sistema de nosso mundo. Isso “acontecerá num período inimaginavelmente longo de tempo no futuro” (2009, 3). O mundo terminará devido à impermanência da natureza, impermanência das coisas compostas, o envelhecimento das coisas . . . Nem os deuses, nem os devas, nem satanás, nem seres elevados e nem humanos jamais serão capazes de dar fim ao sistema do mundo. O mundo vai terminar por si, por causas naturais, a saber, envelhecendo e morrendo (2009, 3).
Ainda que o budismo não tenha ensinos sobre o Apocalipse bíblico, a tradição afirma que Buda ensinou o Tantra Kalachakra, que prediz futuras guerras santas em 2424, partindo de Shambala, um reino humano, e terminando logo antes do início da era dourada de Kalachakra. O conflito dos guerreiros de Shambala é com os muçulmanos e outros. Alguns estudiosos afirmam que isso é apenas simbólico, ainda que os textos indiquem claramente a forma de um jihad budista (Berzin 2001, 1-7).
Em geral, o budismo clássico formal enfoca pouco o discernimento ou o que interfere no futuro, exceto para vencer o karma com atos meritórios intencionais e, como escreve Dhammananda, pela transferência do mérito para outros segundo modos prescritos por Buda (2002, 393-397). Mas Buda predisse estados futuros do mundo. Certa manhã, antes de acordar, o rei Pasenadi de Kosala, contemporâneo de Buda, teve dezesseis sonhos ou presságios. Ele foi perguntar ao Buda a respeito do significado deles. A partir deles, Buda predisse condições futuras do mundo e do futuro do budismo. Buda predisse que muitos mostravam o declínio da humanidade em termos morais e religiosos. Alguns indicavam a queda de monges em frouxidão moral e comercial (Veerananto 2008, 1-12).
A maior parte do budismo clássico dá pouca ênfase à adivinhação ou previsão do futuro. Práticas do budismo popular preencheram o vácuo desse meio excluído ou, mais precisamente, de tudo o que foi excluído no budismo clássico. Terwiel afirma: “mesmo aqueles aspectos da religião que estão obviamente no âmago da tradição budista são interpretados tanto pelo lavrador como pelo monge rural à sua própria maneira mágico-animista característica” (2012, 262).
Reconhecendo isso, o escritor budista moderno Sri Dhammananda acrescenta de modo significativo um capítulo 17 conclusivo sobre “Adivinhação e Sonhos” em sua quarta edição de Em que os Budistas Acreditam (2002, 398-418).
Ele afirma: “O budismo não condena a astrologia” (2002, 402). “Há uma ligação direta entre a vida de um indivíduo humano e o vasto funcionamento do cosmos.” (2002, 402). O zodíaco “responde pelo nascimento de pessoas incomuns durante certos meses” (2002, 400). Os horóscopos “mostram a força kármica que a pessoa carrega, calculado a partir do tempo de nascimento” (2002, 401). Ele observa três energias — cósmica, kármica e mental — que interagem de maneira concorrente (2002, 402). Assim um astrólogo capaz, compreendendo essas forças, “pode mapear com acuidade razoável o curso da vida de alguém, tendo por base o momento de seu nascimento” (2002, 403). Mas “só um Buda pode predizer algo com perfeita exatidão” (2002, 403). Ele conclui: “ o budismo ensina que por meio do intelecto a pessoa pode arrumar a própria vida em harmonia com os planetas e também cultivar talentos inerentes e manipulá-los para sua melhora pessoal” (2002, 405).
Dhammananda reconhece outras formas de predição. “O budismo não refuta a crença em deidades, espíritos, astrologia e leitura de sortes” (2002, 406). Entretanto, “a pessoa deve vencer todos os problemas e dificuldades com esforços próprios e não por meio de deidades, espíritos, astrologia ou leitura de sortes” (2002, 406). “A atitude do budismo para com a consulta a médiuns é de neutralidade” (2002, 409). Embora “não seja uma prática budista . . . não há motivo para os budistas fazerem objeção a tais práticas” (2002, 409). Ele observou que Nagasena, estudioso budista em Kashmir por volta de 150 a.C., detalhou seis causas para sonhos, incluindo a intervenção de forças sobrenaturais, a influência de eventos futuros e sonhos proféticos. Nagasena declarou que a última categoria “são as únicas importantes” (2002, 411).
Segundo minhas observações, os adeptos budismo popular empregam muitos meios para obter orientação para o seu futuro incerto. Eles se consultam com bhikku (monges), xamãs, adivinhos, mágicos, leitores de sorte, sábios, videntes, profetas, médiuns e vários tipos de curandeiros e feiticeiros para determinar e prever o futuro. Eles também buscam a ajuda de ancestrais, fazem ofertas para apaziguar o espírito deles (fantasmas famintos — preta), especialmente em tempos de perigo, provação, provas, tragédias, desastres e perigo. Os budistas utilizam interpretações de sonhos, visões, manifestações de demônios, conselhos de entendidos, lançamento de dados, números mágicos ou objetos e até o som natural de certos animais como a lagartixa tokai (tukkae em tailandês) como sinais numinosos. Eles usam varas de sorte, julgamento por provações, oráculos, psicografia, comunicação com espíritos numa linguagem sagrada, votos, maldições / bênçãos, orações ao Buda e ao mundo dos espíritos, augúrios por sacrifícios, sangue, órgãos, crânios e ossos (especialmente entre tibetanos) e às vezes leitura de elementos naturais como água, cinzas, formação de ventos (nuvens).
Esse mundo conglomerado de adivinhação, mágica e incertezas identifica e indica uma necessidade profunda dos budistas em relação a futuros agourentos. Assim, os missiólogos precisam considerar isso com seriedade, especialmente nos primeiros estágios da evangelização, plantação de igrejas e discipulado.
Raciocínio e aplicações missiológicas
Onde domina uma carência tão dinâmica, é pertinente a necessidade de desenvolver com urgência substitutos funcionais bons e adequados. Assim, é preciso buscar e aplicar alternativas cristãs equivalentes a funções e práticas locais de adivinhação, especialmente para ajudar os interessados e a primeira geração de convertidos a transpor o envolvimento com práticas espirituais demoníacas. Foi mais fácil para Deus tirar Israel do Egito do que tirar o Egito dos israelitas. Como os cultos ancestrais, esses tipos de hábitos cotidianos inculcados tendem a ser perpetuados de maneira automática e persistente, mesmo depois de se tornarem cristãos, a menos que se implantem, no ministério da igreja, substitutos efetivos para essas funções culturais.
Aqui é relevante a aplicação dos ritos de passagem de Arnold Van Gennep. Ele propôs três passos inter-relacionados: separação, transição e incorporação. Assim como a conversão transfere as pessoas do antigo estado para um novo, é preciso uma transição. Substitutos funcionais proporcionam essa transição.
Os problemas surgem quando não há ensino ou implementação de dispositivos para essa transição. Quando as necessidades inerentes dos convertidos não são tratadas ou satisfeitas, os cristãos podem praticar secretamente velhos costumes proscritos, dando lugar a um verdadeiro sincretismo. Quando eu era missionário novato, uma família cristã me convidou para dedicar uma nova choupana construída para a filha recém-casada. Eu aceitei, mas depois percebi que antes de eu chegar, haviam acendido velas e incenso nos degraus do novo lar como oferendas para os espíritos protetores. Sincretismo secreto sinistro! Em outra vila remota, um mercador budista de arroz e sua família creram. Uma igreja no lar começou na casa deles. Por vários anos percebi que eles não cresciam de modo vibrante na fé. Descobri que a causa era que a esposa sentia que não podia largar suas imagens mantidas no quarto. Depois que ela desistiu deles, a igreja floresceu.
Pelo estudo da importância da adivinhação em culturas budistas, compreendemos sua função cultural de predição. Então podemos adotar um modelo ou função culturalmente relevante para ajudar a transferir para Deus, que controla o futuro, a fidelidade antes dedicada a agentes humanos. O alvo é transferir e transformar o medo em confiança, a incerteza em segurança e a ansiedade em fé. De fato, os cristãos não conhecem o futuro e não podem predizê-lo por completo. Como crentes, sabemos pela fé e segurança no Espírito Santo que nosso futuro está nas mãos do Senhor. Confiamos na Bíblia. Entretanto, não é contrário à Bíblia nem ao cristianismo a busca de meios para ajudar a apaziguar os temores do povo de Jesus que está saindo do budismo, pessoas que ainda estão profundamente preocupadas e temerosas quanto ao futuro.
De modo significativo, em De Times Square a Timbuku, Granberg-Michaelson dedica cinco capítulos a uma “excelente reflexão estratégica e teológica” (2013, 1). O terceiro de seus quatro princípios indica que “a teologia deve ser sempre local e contextual, mas nosso ponto de interação mais importante está nos temas do poder e do sofrimento” (2013, 1). Isso cabe perfeitamente no modelo de realidades espirituais para adeptos do budismo popular.
O medo do mundo dos espíritos e do sofrimento por causa do karma e do inescapável ciclo de vida (samsara) são a ruína dos budistas. A incerteza do futuro potencializa o medo. Com frequência eles o entregam à sorte ou destino. Portanto, antes de tudo, os obreiros devem treinar os interessados e crentes para que realmente saibam que o Senhor é soberano e vivo hoje. O futuro está nas mãos dele. Então ensinem a confiar no Deus Criador, a depender de Cristo orando em seu nome e a manter a fé inabalável nesse Deus todo-poderoso. Essa instrução é essencial, especialmente no que diz respeito ao futuro. Os homens não têm controle real do futuro, exceto para colocá-lo, junto com a própria vida, integralmente nas mãos de Deus. Para viver atravessando o desconhecido e o incerto, o assustador e o inesperado, o inseguro e o ameaçador em nosso mundo tenebroso contemporâneo é preciso uma fé que afirme constantemente que Deus é, Deus controla e Deus é confiável mesmo quando Satanás nos assalta. Fale dos cuidados de Deus para com o futuro de Moisés, José, Daniel, Paulo e Jesus. O compartilhamento de lições e ilustrações vivas de como fiéis de passado budista venceram fardos do presente e temores do futuro ajuda a instilar “fé em Deus”. Essa pode ser a experiência mais importante que os plantadores de igrejas podem legar aos interessados e novos convertidos de formação budista (Mc 11.22-26).
Os cristãos, especialmente os do Oriente, também precisam enfrentar o mundo espiritual da adivinhação budista em seu empenho para alcançá-los. Os obreiros precisam compreender essa cosmovisão e humildemente adaptar funções que transponham suas próprias lacunas culturais de questões intermediárias camufladas. Negá-las é prejudicial à comunicação. Reconhecê-las como realidades espirituais ajuda a construir pontes para contato, enquanto a adaptação de sua função propicia o contato e a comunicação.
Além disso, ensine os budistas interessados a confiarem no poder de um Deus vivo e amoroso para controlar o futuro. Seja um modelo disso diante deles. Instrua-os no sentido de experimentarem sua compaixão inabalável pela humanidade e confiarem em sua abundante graça e misericórdia para os que confiam nele. Também os faça lembrar de sua longanimidade para com eles. Instrua-os acerca da proteção do Deus Criador, da provisão divina e da providência geral para com todas as pessoas, tanto as que confiam nele como as que o negam. Os propósitos de Deus são primeiramente de salvação para os perdidos sem esperança e de redenção para os que se arrependem, não de retribuição. Dar testemunho de como Deus ajudou a vencer crises ou proveu recursos em tempos de necessidades fortalece a fé daqueles que temem o futuro. Dê ênfase à memorização de Escrituras como o Salmo 23 e Mateus capítulos 5 e 6. Isso encoraja a vida de fé. Igrejas fortes edificadas a partir de comunidades com perspectivas frágeis e incertas acerca do futuro são estabelecidas mediante mudanças nítidas de cosmovisão e fundadas sobre uma teologia sólida baseada na Bíblia. Essa mudança exige uma reorientação para que confiem no Deus onipotente, e não dependam unicamente de si mesmos, como ensinou Buda. Isso é um grande avanço para crentes de passado budista.
Jamais me esquecerei de quando visitei em Hirosaki, no Japão, um casal dono de um pequeno restaurante. Eles haviam se convertido do budismo. O restaurante deles tomava grande parte do tempo deles, inclusive domingos, que em geral era um dia corrido e muito lucrativo. Sendo novos convertidos, estavam preocupados em frequentar a igreja e guardar o domingo de um modo mais bíblico. Então resolveram honrar Deus e confiar nele, fechando o restaurante aos domingos. Os proprietários de outros restaurantes da vizinhança e muitos de seus amigos e familiares lhes disseram que eles eram loucos, estariam falidos em poucos meses e que perderiam o negócio. Entretanto, por fé e obediência, o casal manteve o voto a Deus. Surpreendentemente, o negócio deles frutificou grandemente durante a semana e prosperou muito. Na vizinhança, vários budistas proprietários de restaurantes largaram o negócio alguns meses depois de terem reprovado o casal. Deus foi fiel contra todos os temores de fracasso futuro. O negócio deles só aumentou por terem honrado Deus.
Outro meio de combater o medo e a frustração de necessidades temporais e exigências futuras é desenvolver igrejas locais de modo que sejam centros comunitários funcionais, tanto para ajudar crentes locais a serem ministrados, como para servir aos budistas das redondezas. Assim como os mosteiros funcionam como centros para atividades da comunidade, assim também a igreja devia estar a serviço no meio da comunidade. Essa é outra forma de substituição funcional. Os budistas podem entender que isso seria os cristãos acumulando crédito. Mas o genuíno serviço altruísta é a manifestação da gratidão a Deus pela salvação recebida, não meio para obter redenção. A forma pode ser semelhante, mas o motivo funcional da verdadeira compaixão e ação amorosa é diferente. Cerca de quarenta versículos dos evangelhos e epístolas propõem ações para ajuda mútua (Smith 1977, 25-26).
Sejam exemplos, ensinando que os valores familiares brotam de devoções e orações da família unida. Famílias que oram juntas tendem a permanecer unidas e a ajudar uns aos outros quando chegam tempos de crise. Famílias que enfrentam tempos difíceis juntas, pela graça de Deus, saem delas, tornando-se mais fortes. Princípios fundamentais de parentalidade e formação de família, criação de filhos, busca de um parceiro, como se candidatar a um emprego e o valor da educação para filhos e pais são outros tópicos para o envolvimento da igreja no serviço de consultoria para a comunidade ao redor. Isso significa que embora pastores, presbíteros e profissionais na congregação possam ser os principais treinadores dos leigos da igreja, é a igreja inteira que está a serviço da comunidade. Esse é o alvo. Todos os crentes devem estar integrados em suas comunidades locais. Uma igreja que conheço tinha a prática de levar cada novo membro que se juntava à igreja a se comprometer a servir em um ministério da igreja. Assim, todos os membros, velhos e novos, tinham um envolvimento prático na igreja e na comunidade. Eles podiam trocar de função todo ano, se o desejassem. Os líderes da igreja eram mais mentores e supervisores, mas todos estavam envolvidos na comunidade ao redor.
Outro temor comum de budistas rurais ou suburbanos quanto ao futuro é se terão recursos financeiros adequados para sobreviver. Muitos vivem um dia de cada vez, na penúria. Muitos fazem dívidas vultosas com agiotas. Quando têm dinheiro, a tendência é gastá-lo sem pensar no que pode acontecer amanhã. Membros qualificados da igreja podem aconselhar famílias ou promover aulas para instruir e treinar membros da comunidade para que saibam como lidar com as finanças de modo adequado, inclusive como viver de acordo com as posses, fazendo alguma poupança para emergências, como montar orçamentos realistas, como fazer uma contabilidade básica e como desenvolver cooperativas e uniões de crédito. Talvez até estabelecer um fundo comunitário rotativo por meio do qual todas as famílias da comunidade, inclusive as cristãs, participem com contribuições regulares. Então cada membro teria sua vez de fazer uso dos fundos para projetos ou necessidades específicas. De modo semelhante, os membros da igreja podem oferecer treinamento de saúde pública, medicina preventiva básica, higiene e vida saudável e hábitos de alimentação nutritiva. A comunicação efetiva nessas lições pode ser ampliada por contação de histórias, uso de parábolas, folclore ou lendas locais, bem como pelo uso de poesias, músicas, encenações e danças de estilo nativo, mas orientação cristã.
É crucial compreender as formas culturais e as necessidades profundas do povo para prestar um serviço verdadeiro às pessoas e suas famílias, especialmente em tempos de crises, perdas, frustrações e desespero inesperados. Portanto a igreja, seus leigos e líderes devem considerar cuidadosamente a possibilidade de adaptar funções vitais que complementem necessidades e expectativas chaves de adeptos do budismo popular em sua predileção pela adivinhação do futuro.
Por fim, uma reflexão séria para desenvolver substitutos funcionais adequados para atividades chaves como adivinhação (como aconselhamento sábio) e leitura de sortes (admoestação compassiva em relação a preocupações com o futuro) pode se mostrar mais proveitosa para fazer conexão com adeptos do budismo popular. Suprir a dinâmica por trás de suas dependências de leitores de sortes ou adivinhos nativos exige, evidentemente, uma seleção e implementação sábia de funções específicas. Romanos, Coríntios, Efésios e Pedro alistam quase vinte dons espirituais. Os membros devem ser incentivados a empregar seus dons bíblicos de discernimento, fé, profecia, admoestação, conhecimento, exortação, socorro e intercessão para o bem da comunidade. Com a experiência, esses dons aplicados serão aprimorados e lapidados de maneira eficiente. Pastores e presbíteros em geral consideram suas funções mais voltadas para a pregação, administração e ensino. Acrescentando uma função ampliada de aconselhamento sábio que use de compaixão e de confrontações de problemas de maneiras nativas aceitáveis, poderiam atuar de modo muito semelhante ao adivinho local. Com empatia, compreensão, consideração amorosa, consolo, oração e conselhos lúcidos, esses conselheiros-orientadores poderiam superar e até sobrepujar a façanha dos leitores de sortes. Uma área que carece de mais atenção diz respeito à morte na família. Em termos culturais, é preciso haver, entre os budistas, mais envolvimento de pastores nessa função similar à dos adivinhos, bem como à dos consoladores. Os líderes e também os membros das igrejas precisam estar mais conscientes do que está acontecendo em suas comunidades. Eles precisam estar mais prontos para visitá-los e aconselhá-los e disponíveis e abertos para aquelas interrupções divinas que simplesmente acontecem. Eles precisam estar mais envolvidos com a população, os negócios e os líderes comunitários locais. Visitas matinais aos cafés na Ásia budista encontram centros de informações para as últimas notícias e rumores. Conhecer abades e monges do templo e fazer amizade com eles é outro caminho para a sensibilização. Orar por eles e, às vezes, com eles cria respeito e união, um esforço que compensa.
Conclusão
Nas diferentes seitas do budismo há uma grande variedade de meios para predizer ou adivinhar o futuro, com vários métodos para discerni-lo. Muito disso diz respeito à orientação por meios mágicos ou forças espirituais e discernimento humano. Com frequência, a decisão quanto a atos futuros depende do resultado de como o conselho, orientações específicas e várias maneiras pelas quais o futuro ou a sorte é predito por meio de praticantes especializados.
Deus é a solução maior para a adivinhação do futuro e para lidar com a miríade de forças espirituais que flagelam as constantes questões budistas acerca da projeção de predições. Só ele os dirige para direções de paz e satisfação na vida, que não encontram por recursos, propostas, programas ou esforços próprios. Os missionários precisam coçar onde está a coceira, ou seja, aplicar as boas novas aos reais interesses dos budistas, não só pregar, por insensibilidade ou ignorância, bons sermões de estimação. Eles precisam considerar as realidades das forças espirituais condicionantes para poderem comunicar de maneira efetiva dentro de culturas budistas nativas específicas. Ignorar o meio excluído das realidades espirituais na população alvo é desconsiderar as condições básicas e os meios estratégicos para alcançá-la. Precisamos falar para o centro do coração e satisfazer necessidades reais daqueles que tentamos alcançar. Tanto os missionários do ocidente como os líderes das igrejas precisam levar em consideração essas realidades espirituais escondidas. Assim, se desejam ser bem sucedidos, influenciando suas comunidades budistas, precisam compreender a cosmovisão delas. A melhor comunicação será por meio daquele mapa mental de realidades espirituais, um mundo misto de magia, adivinhação intensa e controle por parte de multidões de espíritos. Isso inclui entendimento e serviço em todas as três áreas do modelo de Hiebert, mas em especial à seção do meio, a “mágica”.
O ensino sobre o caráter do Deus Criador vivo e seu relacionamento com as pessoas na terra, inclusive sua provisão, proteção, preservação e preparação para o futuro é crucial para ajudar a vencer a autodependência budista. Isso provoca uma mudança em favor da confiança num Deus pessoal amoroso. Instilar uma confiança em Deus no que diz respeito ao futuro, não importando o que venha, é um dom transformador precioso para novos e velhos seguidores de Jesus.
Fazer com que igreja local funcione servindo como um centro comunitário para a população circunvizinha mais ampla é uma estratégia que comunica e engendra ajuda prática e testemunho valioso. O treinamento de famílias, o ensino de saúde pública e de medicina preventiva e o auxílio na gestão das finanças ajudam a prevenir algumas crises futuras ou, pelo menos, fornece às famílias instrumentos para lidar melhor com elas. A igreja como representante local de Deus deve influenciar sua comunidade e inspirá-la com a presença e o poder de Cristo.
O uso funcional de substitutos relevantes para as funções de adivinhação e leitura de sortes entre o povo budista ajuda a reduzir distâncias na comunicação e constrói confiança junto às famílias locais. São necessárias algumas novas funções para os líderes e leigos das igrejas satisfazerem as profundas carências de leitura de sortes e adivinhação. Dons específicos como discernimento de espíritos e aconselhamento ajudam especialmente quando amigos genuínos consolam e encorajam com empatia, e outros dons podem ser otimizados para esse propósito. Pastores, presbíteros e alguns membros precisam acrescentar as funções de conselheiros sábios e orientadores compassivos, tangenciando devidamente as dimensões culturais dos adivinhos e leitores de sortes. Isso requer maior envolvimento pessoal com famílias e comunidades, tendo em vista as futuras crises em potencial que enfrentam, especialmente na morte de parentes.
Embora a Bíblia indique vários meios para adivinhar e discernir o futuro, a maior parte deles está hoje extinta ou não é usada na igreja. Para a maioria, a fé, a oração e a dependência de Deus os suplantou. Mas em culturas regidas pelo budismo popular ainda se emprega uma pletora de métodos de adivinhação. Os líderes das igrejas precisam construir pontes para atravessar esse fosso cultural, adaptando e ampliando suas ofertas de consultoria, aconselhamento, discernimento, profecia e amizade. Fazendo isso, muitas famílias budistas temerosas e desconfiadas em suas comunidades podem ser atraídas para o Reino de Deus. É provável que um bom número de redes familiares entre nele cheio de esperança, para o louvor da glória de Deus.
Alex Smith é missionário da OMF Internacional há 45 anos. Serviu por duas décadas entre budistas na Tailândia, e desde então, ministra ao redor do mundo. Ele dá aulas sobre o Budismo, Cristianismo e Religiões Globais em seminários na Ásia e no ocidente.