Os Muçulmanos Do Mundo: Religião, Política e Sociedade
por The Pew Forum on Religion & Public Life
O “Fórum Pew de Religião e Vida Pública” apresentou, meses atrás, o resultado da sua mais nova pesquisa sobre diferentes aspectos da vida religiosa, política e social dos muçulmanos de diferentes partes do mundo. Devido à riqueza das informações contidas na pesquisa, traduzimos e estamos disponibilizando o “executive summary” na sua íntegra. A pesquisa completa em inglês pode ser encontrada clicando aqui.
Pesquisa: 30 de abril de 2013
Realizada pelo Centro de Investigações Pew, uma nova pesquisa sobre os muçulmanos ao redor do globo constata que a maior parte dos adeptos da segunda maior religião do mundo está profundamente comprometida com a fé e deseja que seus ensinos moldem não só a vida pessoal, como também sua sociedade e política. Com poucas exceções, nos 39 países pesquisados, a maioria dos muçulmanos diz que o islã é a única fé verdadeira que leva à vida eterna no céu e que a fé em Deus é necessária para alguém ser uma pessoa moral. Muitos também pensam que seus líderes religiosos devem exercer pelo menos alguma influência em questões políticas. E muitos expressam um desejo de que a xaria — lei islâmica tradicional — seja reconhecida como a lei oficial de seu país.
A porcentagem de muçulmanos que dizem desejar a xaria como “a lei oficial do país” varia muito pelo mundo: de menos de 10 no Azerbaijão (8%) até a quase unanimidade no Afeganistão (99%). Mas sólidas maiorias em grande parte dos países pesquisados no Oriente Médio e Norte da África, África Subsaariana, Sul e Sudeste da Ásia favorecem o estabelecimento da xaria, entre eles 71% dos muçulmanos na Nigéria, 72% na Egito e 89% nos territórios palestinos.
Ao mesmo tempo, a pesquisa constatou que mesmo em muitos países em que há grande apoio à xaria, a maioria dos muçulmanos aprova a liberdade religiosa para pessoas de outra convicção. No Paquistão, por exemplo, três quartos dos muçulmanos diz que os não muçulmanos têm toda liberdade para praticar a religião deles e 96% completos daqueles que têm essa opinião dizem que isso “é bom”. Ainda assim, 84% dos muçulmanos paquistaneses defendem a sagração da xaria como lei oficial. Essas opiniões aparentemente divergentes são em parte possíveis porque a maioria dos defensores da xaria no Paquistão — bem como em outros países — pensa que a lei islâmica só deve ser aplicada aos muçulmanos. Além disso, os muçulmanos pelo mundo diferem quanto ao entendimento do que a xaria significa na prática.
A pesquisa — que envolveu mais de 38.000 entrevistas face a face em mais de 80 línguas com muçulmanos por toda a Europa, Ásia, Oriente Médio e África — mostra que:
Os muçulmanos preferem usar a xaria no âmbito doméstico, para resolver disputas de família e propriedades. Na maior parte dos países pesquisados, é consideravelmente menor a defesa de punições severas, como a amputação das mãos dos ladrões ou a execução de pessoas que se convertem do islamismo para outra religião. E mesmo no âmbito doméstico, os muçulmanos diferem amplamente se questões como poligamia, divórcio e planejamento familiar são moralmente aceitáveis e se as filhas podem receber a mesma herança que os filhos. Na maior parte dos países pesquisados, a maioria das mulheres muçulmanas, bem como os homens, concordam que a esposa sempre tem a obrigação de obedecer ao marido. Aliás, mais de 9 entre 10 dos muçulmanos no Iraque (92%), Marrocos (92%), Tunísia (93%), Indonésia (93%), Afeganistão (94%) e Malásia (96%) expressam essa opinião. Ao mesmo tempo, a maioria em muitos países pesquisados disse que a mulher devia ser capaz de decidir por si quanto ao uso do véu.
Acima de tudo, a pesquisa constata que a maioria dos muçulmanos não encontra uma tensão inerente entre ser devoto religioso e viver numa sociedade moderna. Também não vê nenhum conflito entre religião e ciência. Muitos defendem a democracia acima da regra autoritária, creem que os humanos e outros seres evoluíram ao longo do tempo e dizem que pessoalmente gostam de filmes, músicas e televisão ocidentais — apesar de a maioria pensar que a cultura popular ocidental mina a moralidade pública.
A nova pesquisa também permite algumas comparações com a pesquisa anterior do Centro de Investigações Pew acerca dos muçulmanos nos Estados Unidos. Como os muçulmanos pelo mundo, os muçulmanos nos Estados Unidos expressam em geral um forte compromisso com a fé e não costumam ver um conflito inerente entre ser devoto e viver numa sociedade moderna. Mas os muçulmanos americanos são muito mais propensos que os de outros países a terem amigos chegados que não partilham da mesma fé e estão muito mais abertos à ideia de muitas religiões — não só o islamismo — podem conduzir à vida eterna no céu. Ao mesmo tempo, os muçulmanos americanos são menos inclinados que os correligionários ao redor do globo a crer na evolução; nesse assunto, estão mais perto dos cristãos americanos. Poucos muçulmanos americanos proclamam apoio a atentados suicidas com bombas ou outras formas de violência contra civis em nome do islã; 81% diz que tais atos nunca são justificáveis, enquanto menos de um décimo afirma que a violência contra civis é frequentemente justificável (1%) ou às vezes justificável (7%) para defender o islamismo. Pelo mundo, a maioria dos muçulmanos também rejeita atentados suicidas com bombas e outros ataques contra civis. Entretanto, minorias expressivas em alguns países dizem que tais atos de violência são pelo menos às vezes justificáveis, como 26% dos muçulmanos em Bangladesh, 29% no Egito, 39% no Afeganistão e 40% em territórios palestinos.Essas são as principais constatações de uma pesquisa mundial realizada pelo Centro de Investigações Pew para o Fórum sobre Religião e Vida Pública. A pesquisa foi realizada em duas etapas. Quinze países subsaarianos com grande população muçulmana foram pesquisadas em 2008–2009 e alguns de seus resultados, previamente analisados no relatório “Tolerância e tensão: islamismo e cristianismo na África Subsaariana”, do Centro de Investigações Pew, em 2010. Outros 24 países na Europa, Ásia, Oriente Médio e África foram pesquisados em 2011–2012; os resultados a respeito de crenças e práticas religiosas foram primeiro publicadas no relatório, “Os muçulmanos do mundo: unidade e diversidade” do Centro de Investigações Pew, em 2012. A pesquisa atual concentra-se em atitudes sociais e políticas dos muçulmanos e incorpora dados das duas etapas da pesquisa. Outras constatações importantes:
- Pelo menos metade dos muçulmanos na maioria dos países pesquisados diz que tem preocupação com grupos religiosos extremistas em seu país, entre eles dois terços ou mais dos muçulmanos no Egito (67%), Tunísia (67%), Iraque (68%), Guiné Bissau (72%) e Indonésia (78%). No cômputo geral, há mais pessoas preocupadas com extremistas islâmicos do que com extremistas cristãos.
- Preponderantemente, os muçulmanos em todo o mundo consideram imorais certos comportamentos como prostituição, homossexualidade, suicídio, aborto, eutanásia e consumo de álcool. Mas atitudes com respeito à poligamia, divórcio e controle de natalidade são mais variadas. Por exemplo, a poligamia é considerada moralmente aceitável por apenas 4% dos muçulmanos na Bósnia-Herzegovina e no Azerbaijão; por cerca de metade dos muçulmanos nos territórios palestinos (48%) e na Malásia (49%); e pela grande maioria dos muçulmanos em alguns países da África Subsaariana, tais como o Senegal (86%) e a Nigéria (87%).
- Na maioria dos países em que se questionou acerca dos chamados homicídios “de honra”, a maioria dos muçulmanos diz que tais assassinatos nunca são justificáveis. Só em dois países — Afeganistão e Iraque — a maioria aceita execuções extrajudiciais de mulheres que teriam envergonhado a família envolvendo-se em sexo pré-marital ou adultério.
- Relativamente poucos muçulmanos dizem que as tensões entre um observante mais religioso do islamismo e um observante menos religioso é um grande problema em seu país. Na maioria dos países em que se fez essa pergunta. Os muçulmanos também percebem pouca tensão entre os membros das duas maiores seitas muçulmanas: o sunismo e o xiismo — ainda que um terço ou mais dos muçulmanos do Paquistão (34%) e do Líbano (38%) consideram o conflito sunita—xiita um problema muito grande.
- Os muçulmanos na África Subsaariana estão mais propensos que os muçulmanos pesquisados em outras regiões a dizer que participam de reuniões inter-religiosas e são versados em outras religiões. Mas porcentagens substanciais de muçulmanos na África Subsaariana também percebem hostilidade entre muçulmanos e cristãos. Em Guiné-Bissau, por exemplo, 41% dos muçulmanos dizem que “a maioria” ou “muitos” dos cristãos são hostis para com os muçulmanos e 49% dizem que “a maioria” ou “muitos” dos muçulmanos são hostis para com os cristãos.
- Em metade dos países em que foi perguntado, maior parte dos muçulmanos deseja que os líderes religiosos tenham pelo menos “alguma influência” em questões políticas e minorias consideráveis na Ásia, Oriente Médio e Norte da África pensam que os líderes religiosos devem ter muita influência política. Por exemplo, 37% dos muçulmanos na Jordânia, 41% na Malásia e 53% no Afeganistão dizem que os líderes religiosos devem desempenhar papel “importante” na política.
- O apoio para fazer da xaria a lei oficial tende a ser maior em países como o Paquistão (84%) e o Marrocos (83%), em que a constituição ou as leis básicas favorecem o islã acima de outras religiões.
- Em muitos países, os muçulmanos que oram várias vezes por dia são mais propensos a fazer da xaria a lei oficial que os muçulmanos que oram com menos frequência. Na Rússia, Líbano, territórios palestinos e Tunísia, por exemplo, os muçulmanos que oram várias vezes por dia apoiam pelo menos 25% mais a sagração da xaria que os muçulmanos menos devotos. Em geral, porém, a idade, o gênero e o grau de instrução interferem pouco no apoio à xaria.
CENTRO DE PESQUISAS PEW – Fórum Pew de Religião e Vida Pública
Fórum Pew de Religião e Vida Pública é um projeto do Centro de Pesquisas Pew, subsidiária da Fundação Filantrópica Pew.Copyright 2010 The Pew Forum on Religion & Public Life.
http://www.pewforum.org/2013/04/30/the-worlds-muslims-religion-politics-society-overview/