A teoria dos paradigmas de Kuhn aplicada na teologia da missão
por Rafael Zulato Langraff
Este é o terceiro texto de uma série de cinco reflexões introdutórias acerca do livro “Missão transformadora – mudanças de paradigma na teologia da missão” de David J. Bosch. O presente artigo se propõe a apresentar a relevância que tem para a teologia da missão a filosofia de Thomas Kuhn acerca do desenvolvimento do conhecimento por meio da quebra de paradigmas. Este argumento é fundamental para o trabalho de Bosch que tem por objetivo principal apresentar o novo paradigma emergente da missão e, portanto, se estabelece sob tal perspectiva.
Da dialética à teoria de Kuhn
O filósofo alemão Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770-1831) defendia que o conhecimento da verdade era resultante da dialética. Todo conhecimento, segundo ele, tem um primeiro momento denominado de tese. A tese é uma proposição parcial e incompleta da verdade que se torna mais completa somente no segundo momento, na apresentação de sua antítese. A antítese – ou dialética restrita – é a contradição do primeiro argumento ao expor as limitações e falhas da tese. Segue disto um terceiro momento, a saber, a síntese. Aqui, os aspectos contraditórios entre a tese e a antítese se inter-relacionam gerando o conhecimento mais amplo. Após elaborada, a síntese passa a ser uma nova tese, que deverá ser contraposta com uma antítese, gerando uma nova síntese, que por sua vez, será tomada como a nova tese e assim sucessivamente. A filosofia dialética de Hegel, portanto, consiste na observação do desenvolvimento do pensamento através de um fluxo linear de teses, antíteses e sínteses.
Por muito tempo, acreditou-se que a ciência se desenvolvia por meio da construção linear e sobreposta de conhecimentos sendo as novas descobertas uma evolução natural alicerçadas no conhecimento anterior. O físico e historiador da ciência Thomas Kuhn (1922-1996) apresentou uma teoria diferente, que resultaria no rompimento com o argumento clássico da dialética.[1] Segundo Kuhn, o desenvolvimento da ciência não se dá por meio da soma de novos conhecimentos de forma linear, antes, ela se desenvolve em sobreposição refutando e terminando por eliminar os paradigmas anteriores. Por paradigmas, entende-se os padrões ou modelos teóricos vigentes em um determinado período. Na física, por exemplo, o paradigma copernicano foi substituído pelo newtoniano e, novamente em seguida, pelo einsteiniano.
Em poucas palavras, a sugestão de Kuhn é que a ciência, em realidade, não cresce cumulativamente (como se mais e mais conhecimento e pesquisa nos aproximassem cada vez mais das soluções finais dos problemas), mas, antes,…
[1] É digno de nota – e no mínimo curioso – que a teoria de Kuhn, apesar de oferecer uma nova perspectiva, pode ser vista como uma antítese da tese de Hume do desenvolvimento dialético e, portanto, termina por confirmar o método dialético.