Discipulado e globalização: a necessidade de incluir todos (dentro e fora da igreja)
Um novo modelo de missão para a pós-modernidade
Christian Giordano
Resumo
Este artigo argumenta a necessidade de ampliar o discipulado cristão a todas as pessoas (dentro e fora da igreja) como parte de um processo continuado de evangelização e formação (discipulado). Seu conteúdo não se limitará a temáticas doutrinárias, mas também se propõe a incluir as ferramentas que nomearão e desmascararão os falsos deuses da globalização e suas liturgias de persuasão, para as quais oferece alternativas bíblicas. Para isso, propõe um novo modelo de missão e um interesse renovado na hermenêutica a fim de que se possa entender o mundo atual. Tais avanços (missão e hermenêutica) possibilitam a reconfiguração do discipulado, da evangelização e da liturgia.
Palavras-chave: boa-nova, discipulado, discipulando, evangelização, globalização, liturgia, mercado global, missão, neoliberalismo, nova modernidade, nova religião sem nome.
Introdução
Quais deveriam ser as linhas mestras que orientam o discipulado cristão no século 21, especialmente no contexto do sul da Europa? Há um acordo generalizado com respeito a como o mundo mudou nos últimos 40 anos, mas não está tão claro quais aspectos afetam a igreja e a formação de sua liderança. Alguns argumentam que o evangelho não mudou e continua sendo “a resposta” a todos e a cada um dos problemas do ser humano e da sociedade.
A globalização, contudo, representa uma mudança não só de quantidade (maior alcance das mudanças), mas também de qualidade (mudanças em outras dimensões e com profundidade). Qual é o alcance da globalização? Se tomarmos como base que a igreja é missionária por natureza, e que sua vocação é contribuir positivamente para a sociedade, sendo ela mesma exemplo (antecipado) do reino de Deus que aponta para Jesus Cristo, qual modelo missionário é adequado para nossa sociedade do sul da Europa?
Por outro lado, nos últimos 40 anos, o mundo evangélico em geral tem progredido prestando maior atenção à questão do discipulado. Alguns preferem chamar as pessoas que estão sendo discipuladas de “seguidores de Jesus”. É o reconhecimento de que encher os bancos das igrejas de membros não é suficiente, uma vez que a ordem de Jesus é para que sejam feitos discípulos e discípulas, pessoas comprometidas que cada dia crescem em sua semelhança com o Mestre. A partir do âmbito latino-americano, René Padilla e a Fraternidade Teológica Latino-Americana vêm insistindo nesse tema desde a década de 1980.1 Pedro Arana costumava dizer “ser discípulos, fazer discípulos e juntar discípulos”.2 O discipulado vem a ser, dessa maneira, uma das ênfases do movimento da igreja missional. Esse foi, inclusive, um tema recorrente no último Congresso de Lausanne (Cidade do Cabo 2010), assim como na Conferência sobre Missão Mundial e Evangelismo (CWME) (Arusha 2018).3
É impossível, porém, formar discípulos se não se conhece bem o mundo atual, porque o discípulo deve viver sua fé hoje, em seu contexto diário. A grande questão é que pretender fazer discípulos exatamente como nos tempos do Novo Testamento não seria plausível hoje em dia, primeiro porque não entendemos o contexto social do primeiro século, e diante disso é completamente impossível pretendermos reproduzir as dinâmicas de discipulado daqueles tempos. Em segundo lugar, porque mesmo que fosse possível (e não é) não serviria para o dia de hoje, já que o discipulado sempre responde aos desafios do presente.4 Daí vem a insistência de se conhecer bem o mundo atual.
Este artigo pretende responder a algumas dessas questões a partir de um ponto de vista missionário. Vamos descrever o modelo missionário predominante, as mudanças da sociedade atual que afetam diretamente o tipo de discípulo que se faz necessário e quais são as características da globalização. Tudo isso nos permitirá apresentar sugestões concretas em relação à formação de discípulas e discípulos apropriados ao século 21. O discipulado será o foco de trabalho do Movimento de Lausanne-Espanha nos próximos anos, e a eles, em primeiro lugar, dirijo este artigo.
Modelo missionário
A definição do que significa ser igreja e qual classe de discipulado ou formação de membros se deve levar a cabo depende, no fundo, do tipo de modelo missionário que se tem. Esse modelo está tão arraigado que de fato constitui, a priori, algo dado como certo. A realidade é que o modelo missionário comum, tanto a católicos, protestantes, como a evangélicos, permanece inalterado desde os tempos do imperador Constantino. Geralmente o ano de 313 d.C. é marcado como o ano em que o Império Romano oficializou o fim da perseguição contra os fiéis cristãos por meio do Édito de Milão. A partir desse momento, as igrejas cristãs se consolidaram e começaram a se estabelecer na sociedade até alcançar poder político juntamente com o império. Isso é o que se conhece pelo nome de cristandade: a mistura do poder religioso com o poder político. Por essa época mudou também o modelo missionário. Praticamente todo o império já era cristão ou estava no raio de influência da igreja cristã, e os não cristãos, os bárbaros, estavam distantes, além das fronteiras. Por isso, o modelo missionário que surgiu enviava especialistas, geralmente monges, a lugares distantes, para converter os pagãos e estabelecer a igreja. Esse foi chamado de modelo missionário da cristandade.5
Hoje, dezessete séculos depois, continuamos com o mesmo modelo, ainda que com pequenas variantes. Em meados do século 20, os destinatários da missão eram os não crentes, os que “não haviam ouvido”, os “não alcançados”, quer estivessem longe ou perto, em nossas cidades e bairros. No século 21, a balança da missão se moveu para o Sul global, ou seja, a força missionária predominante da igreja, e por conseguinte a sua ação missionária, já não está no hemisfério Norte e no Ocidente, mas na África, Ásia e América Latina. Entretanto, o modelo missionário não mudou: continuamos enviando especialistas, agora a partir de todas as partes para todas as partes.6
O mundo mudou
Todos estão de acordo que o mundo mudou, e muito, nos últimos 30 anos (desde a queda do muro de Berlim). Alguns aderem às mudanças circunstanciais, aos avanços da tecnologia. Permito-me assinalar três aspectos de base que afetam em cheio a igreja, a missão e o discipulado. São aqueles aspectos que não são visíveis à primeira vista porque estão enterrados num âmbito mais profundo das pressuposições da sociedade atual, constituem seus fundamentos.
Queda dos grandes ismos
Em primeiro lugar, um aspecto determinante tem sido a queda dos “ismos” políticos, sociais e econômicos. O comunismo e o socialismo, assim como o capitalismo mercantil tiveram seu auge… e sua morte. Da mesma maneira, a modernidade, como grande projeto surgido do Iluminismo, recebeu sua sentença de morte nas revoltas estudantis de maio de 1968 em Paris. A exaltação do saber e da ciência, a centralidade do ser humano e o secularismo já não representam a essência da sociedade atual, mas a sua antítese. De outro lado, a queda das grandes verdades sociais trouxe como consequência uma desilusão generalizada. Em decorrências dessas quedas, não surpreende que agora fique difícil acreditar em algo e que nossas sociedades se caracterizem por falta de esperança.
Nova modernidade
Em segundo lugar, nasce uma nova modernidade7, um tipo de “ferro misturado com barro” (Dn 2) que é a inegável herdeira da modernidade, mas com três características básicas bem diferentes.
- A nova modernidade já não confia na ciência como um deus que conserta tudo, mas confia na tecnologia. A tecnologia se transformou no elemento indispensável, insubstituível da vida cotidiana, do ensino, do comércio, da vida social etc. Alguns pensadores definem o ser humano do século 21 como homus tecnologicus.8 Essa é sua principal marca identitária.
- O segundo elemento constitutivo da nova modernidade é o surgimento do mercado global totalizante de estilo neoliberal. O mercado tradicional existiu desde os primórdios da humanidade, porém esse novo mercado é diferente em sua essência: não há forma de se escapar dele. De um lado, já não está mais limitado pelas fronteiras nacionais, e, graças à Internet, é possível comprar e vender a partir de qualquer parte. De outro lado, o mercado se converteu em um sistema integrado e fiscalizado. Cada dia é mais difícil viver sem uma conta bancária, sem cartão de débito/crédito, sem um cadastro de nomes, sem número de seguro social (ou similar) etc. Todos esses elementos contribuem para a hegemonia do mercado. Por isso, o novo mercado é qualificado como global e totalizante. Já não é apenas um instrumento de compra e venda que fazia parte de uma sociedade inter-relacionada. É o novo poder que a doutrina neoliberal cedeu para “desregular”, como se o mercado estivesse, virtualmente, por cima das leis. De acordo com o ideário neoliberal, todos os entraves ao livre crescimento do novo mercado devem ser abolidos. Ele é a lei e a impõe. Apenas uns poucos, na sombra, manejam os fios do mercado global totalizante, enquanto a grande massa de cidadãos mundiais passou a ser mera consumidora, como um hamster girando sem fim numa rodinha: produzem para consumir… e serem consumidos nesse processo. Lamentavelmente, o mercado global totalizante também é um deus ávido por vítimas. Os milhões de excluídos do mercado são as vítimas desse sistema, porque são demasiado pobres para consumir de forma normal. Eles são lançados à “economia submersa” (a do mercado de toda a vida humana) estigmatizada como ilegal. Hugo Assmann e seu discípulo Jung Mo Sung descreveram a idolatria do mercado.9 O teólogo Samuel Escobar incide na impossibilidade de se escapar do mercado, ao que qualifica como irresistível. “Como uma onda irresistível, o mercado é a força principal que está por trás do processo de globalização.”10
- O terceiro elemento dessa nova modernidade é o auge da espiritualidade e da militância das grandes religiões globais. A modernidade profetizou a morte de Deus, de toda classe de deus e religião. Durante o século 19 e a primeira metade do século 20, a mensagem era que a ciência secular ia colocar de lado, definitivamente, a religião como superação de uma etapa supersticiosa. Contudo, hoje, é inquestionável o papel protagonista que desempenha a religião para três quartos da população do planeta.11 Assistimos ao ressurgir de várias das grandes religiões mundiais: o islã, o hinduísmo e, em menor medida, o budismo. Da mesma maneira, os povos originários estão valorizando suas religiões ancestrais, por exemplo, nos países andinos, em regiões da África e na Austrália. No Ocidente, assistimos ao auge da espiritualidade, entendida como uma busca pessoal de significado e afirmação.
Outra religião
O terceiro aspecto de base que marca uma mudança drástica no mundo de hoje é o nascimento de uma nova religião. Uma religião secular e encoberta, que não se apresenta como tal e que se cobre de uma linguagem neutra, não religiosa. Os sacerdotes dessa nova religião são as estrelas do esporte e um grupo efêmero de personagens midiáticos. Seus templos são os estádios e os centros comerciais, cada um mais deslumbrante que o outro. Essa nova religião é manejada pelos grandes impérios midiáticos,12 um pequeno grupo de magnatas que, valendo-se dos meios de comunicação, ditam ao mundo o que deve ser comprado, os valores em que se deve crer, o que importa, o que “é necessário”, o que é correto e o que se deve considerar antiquado ou inútil. As ferramentas desses impérios midiáticos são sofisticadas e pouco conhecidas: a manipulação, o neuromarketing, a versão interessada das notícias, a análise de gigantes quantidades de dados pessoais e de conduta (datamining e big data) etc. A nova religião sem nome está alicerçada em dois pilares: o consumo e a idolatria.
O consumo é o mantra do ideário neoliberal. É apresentado como o remédio para todos os males. É a frase que está na boca de todos os políticos: “É preciso reativar/incentivar o consumo”. É a medida da felicidade e da autorrealização: você vale o que pode consumir. Aparentemente, o consumo está dirigido à autossatisfação, à realização social, ao bem estar. No fundo mesmo, é uma maneira sutil de fortalecer o caixa de poucos.
O segundo pilar da nova religião é a idolatria. Uma idolatria secular e invisível porque se camufla de normalidade, de sensatez, de ócio. O indivíduo se tornou o ídolo principal. Sua satisfação, suas necessidades, sua autorrealização se tornaram a principal razão de sua vida. A sociedade contribui para essa idolatria repetindo: “Você vale a pena”, “Você pode ser o que quiser”. Os “deuses sociais” (futebol, jogo, ascensão social, promoção no trabalho etc.) são, na realidade, maneiras de realimentar esse eu hedonista e narcisista. Além disso, o mercado tem inculcado outro mecanismo de reforço quando define o indivíduo como provedor: “Eu trabalho duro, produzo, sou autossuficiente…, portanto financio minhas ‘necessidades’, assim como meus caprichos”.
A nova religião sem nome está emparelhada com valores sociais e morais os quais raramente proclama abertamente, mas que transmite e ficam arraigados profundamente nas pessoas por meio de rituais e rotinas. É sua liturgia particular e secular, expressa na forma de músicas, filmes, meios de comunicação social, assim como maneiras de compra e ócio nos centros comerciais, entre outros.
Finalmente, a nova religião é, em última instância, outra “boa-nova” competindo com o evangelho de Jesus Cristo. Promete um futuro melhor, cada vez mais brilhante e sugestivo, para mais e mais milhões de pessoas. É importante notar que a nova religião não exige que se mude de filiação religiosa. Ela representa uma competência religiosa completamente diferente. Apela não somente aos ateus ou não religiosos, mas a todas as pessoas e a todas as sociedades do mundo. Sua “liturgia” é compatível com qualquer outra religião. C. René Padilla já falava contra “nossa cumplicidade na idolatria tóxica do consumismo”.13
Globalização
Além do modelo missionário e das mudanças da sociedade, necessitamos analisar o fenômeno da globalização, ainda que de maneira esquemática, para determinar seus motivos e como afeta o discipulado.
A globalização é um processo econômico, tecnológico, político, social e cultural, em escala mundial, que consiste em uma crescente comunicação e interdependência entre os distintos países do mundo, unindo seus mercados, sociais e culturais, por meio de uma série de transformações sociais, econômicas e políticas que lhes dão um caráter global.14
Difusão mundial de modos, valores ou tendências que fomentem a uniformidade de gostos e costumes.
Econ. Processo pelo qual as economias e mercados, com o desenvolvimento das tecnologias de comunicação, adquirem uma dimensão mundial, de modo que dependem cada vez mais dos mercados externos e menos da ação reguladora dos governos.15
É importante assinalar que a globalização tem aspectos muito positivos. Obviamente, tem contribuído diretamente para aumentar a liberdade pessoal, as possibilidades de escolha e a realização individual. Hoje é possível, por exemplo, estudar à distância. Outro benefício é a redução notável da pobreza global, e isso redunda em aumento da expectativa de vida. Além disso, as possibilidades de conexão e comunicação têm propiciado aproximação entre pessoas diferentes e que vivem distantes umas das outras. O aumento na qualidade e quantidade das comunicações é um exemplo dos benefícios indubitáveis da globalização. Não podemos deixar de lado o fato de que o evangelho é um dos maiores e mais persistentes globalismos da história: desde o alvorecer da humanidade, o Deus da Bíblia ordena ao ser humano que se multiplique e encha a terra (Gn 1.28). Babel foi precisamente um intento de “não se espalharem” (Gn 11.4), justamente o contrário do mandamento divino. Fica claro que a ideia de expansão e de crescimento está impressa no cristianismo. A diversidade faz parte do DNA bíblico: Deus é o autor da diversidade de espécies no Éden, da diversidade de línguas em Babel e, finalmente, para não adicionar aqui muitos exemplos intermediários, a Jerusalém celestial verá aumentada exponencialmente a diversidade: “toda língua, tribo, nação, … nações, reis, materiais, arte, novos céus e terras etc.” (Ap 21, 22). Dessa maneira, podemos afirmar sem temor que a Bíblia fomenta uma globalização segundo alguns parâmetros concretos: o reino de Deus.
De outra forma, o processo de globalização também traz consequências muito negativas. Entre elas, a divisão cada vez mais desigual de recursos, riqueza e oportunidades. Os avanços não têm beneficiado a todos igualmente. No que se refere ao discipulado e à missão, Bryant Myers assinala duas deficiências cruciais da globalização: sua antropologia deficitária e sua falta de moralidade.16
1) De um lado, “você é o que você vale, o que pode produzir, comprar e consumir”. Essa é a identidade que constantemente o sistema globalizado inculca e repete. O valor, a identidade e a meta do ser humano são definidos por parâmetros ligados ao mercado ao invés de parâmetros baseados na criação divina ou no valor intrínseco de cada ser humano. A antropologia defendida pela globalização é incapaz de transmitir valores transcendentes ou inerentes: somente o mercado tem valor inerente, e os seres humanos estão sujeitos a ele. Alguns já falam do novo homo economicus.17
2) Dessa forma, o sistema globalizado de mercado carece por completo de código moral externo e interno. O benefício é o principal referente. Se vontades são atendidas, sejam econômicas ou de autossatisfação, tudo é válido. Os códigos morais das religiões foram retirados e substituídos pela nova religião sem nome. Quando a fé e a religião foram relegadas ao espaço privado pessoal, as fontes disponíveis para se encontrar um guia ético são a economia, a tecnologia e a política, todas controladas pelo benefício, pela funcionalidade e/ou eficiência e pelo poder, respectivamente. Nenhuma dessas três fontes tem a capacidade de prover um código ético ou moral. Analisando Jonathan Sacks, antigo rabino chefe das Congregações Unidas da Commonwealth, Myers expõe:
Em seu importante livro The Persistence of Faith: Religion, Morality and Society in a Secular Age [A Persistência da Fé: Religião, Moralidade e Sociedade em uma Era Secular], Jonathan Sacks argumenta que o erro fundamental da tese da secularização – que a religião ia se dissipar diante do mundo moderno e seus benefícios conquistados pela ciência, tecnologia e economia – está no fato de que a globalização e o humanismo secular são incapazes de responder às perguntas a cerca do sentido e da moralidade. Os seres humanos são seres relacionais inseridos em sociedades. As relações justas e pacíficas são o que importa; o sentido e o propósito são o que importa. Promulgar e sustentar uma ordem moral é uma motivação central e fundamental da ação.18
Notemos, além disso, a falta de autoridade concedida não só ao código ético cristão, mas a todos os códigos éticos: o código dos Direitos Humanos, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, o Tratado de Paris sobre mudança climática, isso para mencionar apenas alguns de âmbito internacional. A consequência é a falta atual de códigos éticos mínimos aceitos por todos.
Três posturas
Ante ao fenômeno complexo da globalização, cabem três grandes posturas: resistir, aceitar tudo ou participar de forma crítica. A primeira postura é a que normalmente caracteriza o ideário tradicionalista. “O mais antigo era melhor; aquilo era normativo” é a essência do argumento apresentado por aqueles que renegam a globalização como um todo. Este ensaio não se propõe a se estender nessa postura. Basta pontuar que é a postura seguida por boa parte da liderança católico-romana espanhola, assim como pelo setor conservador da igreja evangélica. É também a postura generalizada dos líderes religiosos muçulmanos, para os quais a referência da vida “correta” está no passado, na vida e nos ensinamentos do profeta Maomé e de seus seguidores imediatos (seus companheiros, segundo a terminologia islâmica). Como regra geral, o islã rechaça a inovação em nível ontológico.19
A segunda postura é aceitar a globalização, seja como parte normal da vida, seja como um Golias impossível de vencer. Uma alternativa, então, é “cristianizar a globalização”, ou seja, aproveitá-la para os fins religiosos. Por exemplo: utilizar a tecnologia, os meios de comunicação social e a liberdade de movimentos para evangelizar e “fazer a igreja”. Foi a postura que caracterizou a Segunda Conferência de Lausanne (Manila 1989) e que foi rechaçada contundentemente pela maioria dos participantes do chamado Dois Terços do Mundo ou Mundo dos Dois Terços.20
A terceira opção é se e participar de forma crítica. Como já foi dito anteriormente, a globalização tem aspectos positivos, e a Bíblia promove um tipo de globalização. Essa é a postura que defendemos neste ensaio e que ampliaremos na sequência.
Ver, ouvir e entender
Chegamos ao ponto de concretizar ideias e propostas. Começamos este artigo perguntando: quais deveriam ser as linhas mestras que orientam o discipulado cristão no século 21, especialmente no contexto do sul da Europa? Fizemos um “andaime” para poder construir adequadamente uma resposta pertinente. Primeiro, este artigo revisou o modelo missionário; em segundo lugar, ocupou-se das mudanças do mundo que afetam diretamente a fé e o discipulado: a outra modernidade e a nova religião sem nome. Finalmente nos ocupamos da globalização.
Parece-me que a necessidade mais fundamental do campo evangélico atual é estar consciente da necessidade de ver, ouvir e entender o mundo atual, suas tendências e processos. A desconexão geral das igrejas espanholas de seu contexto imediato é um fato que quase ninguém mais questiona. Como apontava Andy Wickham: “Na Espanha, todavia, o diálogo entre os evangélicos e as gerações pós-modernas está desmoronando, porque nós, evangélicos, continuamos imersos na maneira moderna de entender a realidade, enquanto faz décadas que a sociedade abandonou o modernismo”.21 Muitos dos nossos líderes são capazes de descrever profusamente detalhes das sociedades em que viveram, digamos, o profeta Jeremias e o apóstolo Paulo, mas são incapazes de entender a sociedade atual. Urge, portanto, que os líderes evangélicos se voltem ao uso e manejo da hermenêutica: a ciência da interpretação, entendida num sentido amplo. A hermenêutica é a disciplina que busca compreender o significado por detrás dos textos, palavras, arte, comportamentos etc. de uma sociedade. O primeiro significado da hermenêutica se relaciona com as ciências bíblicas, e essa é a prática que lhe deram os eruditos cristãos (e judeus), entretanto faz décadas que seu âmbito de atuação foi ampliado, e de fato se converteu na ciência chave para entender o mundo do século 21. Estuda-se em campos tão diversos como a arquitetura, a filosofia, o jornalismo investigativo e também nas ciências sociais, para nomear os mais conhecidos. É a ciência para ver, ouvir e entender a sociedade.22 23
Uma vez que entendamos a sociedade, poderemos refletir a seu respeito à luz da Bíblia e dar respostas às perguntas antigas, mas também às perguntas novas, próprias da sociedade secular, pós-moderna e pluralista do sul da Europa. Oferecer respostas relevantes a partir da ótica bíblica a tais perguntas é, precisamente, o que significa fazer missão: aproximar a boa-nova à sociedade de hoje.
No momento em que começarmos a ver, ouvir e entender a nossa sociedade, começaremos a perceber o novo modelo de missão, apto não para as sociedades do Novo Testamento ou para as sociedades do século passado, mas para nossa sociedade atual. Entender que a missão já não está “lá fora” (da igreja). Sim, está fora da igreja, mas também dentro, no sentido de que o “campo de batalha mudou de lugar”. Como já foi mencionado, a nova religião sem nome está oferecendo uma “boa-nova” que compete com o evangelho a todos, incluindo os crentes praticantes. É como se o alcance da missão tivesse sido ampliado: não só aos que não creem, mas também aos crentes, enganados pela idolatria do século 21. Por conta disso é que a missão do século 21 necessita 1) equipar e engajar todos os crentes, 2) repensar a verdadeira boa-nova e 3) utilizar novas formas litúrgicas. Em outras palavras: discipulado, evangelização e culto. Note que os elementos não são novos; são os mesmos desde o começo da igreja: kerygma, martyria e leitourgos (ao que deveríamos adicionar diakonia, que está fora do âmbito deste artigo). Ocorre que cada época e sociedade necessita reformular esses conceitos fundamentais em formatos adequados para seu contexto, de maneira que permaneçam fieis à Bíblia. É o que estamos tentando, humildemente, neste artigo.
(1) Novo discipulado
Necessitamos de um discipulado novo, tanto em enfoque como em alcance. Esse é o primeiro desafio a se enfrentar. A palavra discipulado vem sendo empregada num sentido demasiadamente restritivo, como sinônimo do vocábulo “catecumenato”. Seria a instrução aos novos crentes, àqueles que abraçaram a fé cristã recentemente e que estão se preparando para o batismo. Essa definição se baseia em dois pressupostos que foram verdadeiros, mas que deixaram de ser. Primeiro, assume uma visão moderna da verdade e da fé. Presume-se que a fé se transmite por meio de proposições teóricas, de verdades doutrinárias. Como se os discípulos e discípulas, aprendendo intelectualmente as verdades fundamentais da Bíblia e da igreja, já estivessem prontos para se tornar membros da igreja e também prontos para dar testemunho de sua fé. Opostamente a isso, a pós-modernidade (rodeada de secularismo e pluralismo) entende a religião e a fé muito mais como espiritualidade do que como uma lista de verdades teóricas. Para a pós-modernidade, a prova da verdadeira espiritualidade é a autenticidade.
Em segundo lugar, a definição que vem sendo usada para se articular o discipulado parte do conceito de verdade compreendido nos moldes dos séculos 19 e 20. A igreja tem a verdade (que é extraída da Bíblia; voltamos à hermenêutica), e a comunica aos novos crentes. O discipulado é entendido, portanto, como instrução na Verdade (com “V” maiúsculo). A verdade é entendida de forma absoluta. Contudo, tal asseveração sobre a verdade bate de frente com toda a cosmovisão atual. A pessoa normal do século 21 não consegue entender essa verdade, mesmo que se empenhe muito para isso. Não é o caso de que a verdade em si tenha mudado, mas sim a expressão dela. A verdade que a sociedade pós-moderna, secular e pluralista do sul da Europa entende é muito mais experiencial e integrada a situações concretas. Aqui não é lugar para nos estendermos nesse assunto, mas notemos que para Jesus Cristo “o caminho, a verdade e a vida” (Jo 14.6) formam uma unidade. A verdade se conhece “no caminho”, e está intimamente ligada à vida. A verdade é, portanto, uma caminhada vital. Estou dizendo com isso que Jesus Cristo estava mais próximo da pós-modernidade que da modernidade? De maneira alguma! Estou dizendo que a Bíblia deve ser lida com olhos distintos em cada época (hermenêutica), e que continua falando poderosamente a cada época. Por isso é mais que um livro, é a Palavra de Deus.
Ao falar de um novo discipulado, estamos propondo pelo menos três aspectos.
Com foco em todos
É um discipulado com foco em todas e todos, dentro e fora da igreja. Porque todos têm perguntas fundamentais que nem a tecnologia, nem o mercado e nem a nova religião sem nome conseguem responder, porque todos estão lutando, enredados na nova idolatria hedonista do deus Mamom; porque todos estão buscando uma verdadeira identidade. Bryant Myers nos faz notar:
A presença de uma oferta que quer competir com as boas-novas significa que a missão atual começa dentro da igreja e não fora de suas portas. Esse campo de missão se encontra nos corações e mentes das pessoas que estão sentadas nos bancos, que são moldadas durante todos os dias e o dia todo pelas promessas e seduções dos dois globalismos gêmeos (modernidade e capitalismo neoliberal) da globalização. A missão cristã necessita reinventar-se de tal modo que inclua ajudar as pessoas que estão nos bancos a desenvolver a habilidade de ver e ouvir adequadamente, para separar o que é verdadeiro do que é falso diante da grande onda de informação, demandas e seduções que ouvem a cada dia, veem e experimentam em um mundo globalizado.24
Além disso, observe que não há duas mensagens bíblicas – uma para crentes e outra para não crentes –, há um só evangelho. O fato de se dividir o evangelho em partes e para audiências distintas foi característico da modernidade, mas isso já não serve para o século 21. Ao contrário, ter uma só mensagem, igual para todos, contribui para reforçar a autenticidade, característica muito valorizada pela pós-modernidade. Helder Favarin é um dos especialistas atuais que estão advogando em prol de uma pregação sólida, bíblica e dirigida simultaneamente a ambas audiências: crentes e não crentes.25
Fronteira diluída entre evangelização e discipulado
Já faz muitos anos que o movimento de estudos bíblicos Alpha descobriu essa realidade. A fronteira entre a evangelização e o discipulado é muito sutil. Muitos estão interessados em conhecer o que a Bíblia diz sobre Jesus Cristo e, no processo, se comprometem com ele de uma maneira experiencial. Essas pessoas não querem que lhes digamos em que têm de crer, isso lhes parece coação e proselitismo, mas estão abertas, muito abertas de fato, para a evangelização e para o discipulado. Como apontaram Hunter III e Rohde, o pós-moderno secular experimenta “mini conversões”, ou seja, fases sucessivas de aceitação e experimentação de realidades espirituais que desembocam na conversão.27 O que o Alpha e tantos outros exemplos demonstram é que o discipulado começa ainda antes de a pessoa ser, de fato, crente. O discipulado é entendido como uma caminhada, como um movimento vital até Jesus Cristo. Esse movimento começa antes de a pessoa conhecê-lo e segue pela vida toda, crescendo em fidelidade e semelhança com o Mestre.
Criar caráter e identidade
O novo discipulado que estamos descrevendo tem como foco criar caráter cristão e identidade, ou seja, ao invés de responder à pergunta “Em que um cristão deve crer?” como é feito no modelo discipulado-catecumenado, centra-se em desenvolver o caráter de um seguidor ou seguidora de Jesus e sua identidade. Suas perguntas são: “Como era Jesus?”, “O que ele faria em meu lugar?”, “Quem eu sou em Cristo?”. O discipulado, então, se converte em uma transferência de vida do mestre ao discípulo. Tendo em conta que “um exemplo vale mais que mil palavras”, mencionarei alguns dos títulos de capítulos de Khune e Vogel: “Como formar um discípulo humilde”, “Fiel e disposto” [“Faithful and able”], “Um discípulo que serve”, “Um espírito pronto a aprender/ensinar” [“A teachable spirit”].28
(2) Boa-nova para hoje
A segunda característica da missão do século 21 tem a ver com o próprio conteúdo da mensagem: a boa-nova. Não há missão sem evangelização. Mesmo que a primeira seja muito mais ampla que a segunda, são inseparáveis. O problema com a “evangelização ao estilo do século 20” é que é captada pelas pessoas do século 21, ou seja:
- ou haverá profunda rejeição – soará como proselitismo puro e duro;
- ou será recebida com ruído – cairá na irrelevância, não despertará interesse, não merecerá ser escutada.
Antes de prosseguir e qualificar as pessoas do século 21 como duras, insensíveis e hostis ao evangelho, paremos para pensar no teste da evangelização. Por antonomásia, qual é o teste da evangelização? A pergunta-chave para descobrir se nossa evangelização é o que pretende ser é: ela soa como uma boa-nova? Se, na maioria dos casos, ela não soa como uma boa-nova, não deveríamos, primeiro, voltar os olhos para nós mesmos e examinar como estamos evangelizando? Mencionarei três aspectos nos quais a evangelização hoje em dia, especialmente no sul da Europa, se diferencia da evangelização do século passado: linguagem, conteúdo e resposta.
Linguagem
A linguagem religiosa própria de tempos passados soa mal para as pessoas pós-modernas, seculares e pluralistas do século 21. De novo, Wickham assevera:
Nossa maneira de falar como evangélicos transmite uma imagem que o pós-moderno rejeita. (…) Já que o pós-modernismo é uma reação contrária à cosmovisão “idealista” moderna, inclusive sendo considerada ingênua, qualquer ideia que se expresse de uma maneira moderna provoca uma reação negativa. Isso é precisamente o que ocorre quando um evangélico moderno tenta compartilhar o evangelho com não crentes, uma vez que tende a se expressar por meio da cosmovisão moderna.29
Contrariamente, devemos aprender a evangelizar com uma linguagem neutra, não religiosa, que esteja de acordo com o contexto pluralista. O Novo Testamento é um exemplo de como os apóstolos encontraram não somente palavras, mas marcos conceituais adequados às várias sociedades de seu tempo, fossem elas judaica, helênica ou romana, utilizando palavras e conceitos comuns. Algumas igrejas e evangelistas espanhóis estão começando a utilizar uma linguagem atual, e estão ganhando espanhóis para o evangelho, mas ainda precisam polir e melhorar a comunicação. Trata-se de aceitar o marco mental do pluralismo religioso, assim como dos valores seculares, e começar a partir daí o avanço até os conceitos bíblicos. Myers insiste:
Teremos de aprender a nos sentir cômodos trabalhando missionalmente em entornos pluralistas ou seculares. Ser testemunhas fiéis ao trabalhar pelo surgimento dos valores do reino – justiça, paz, retidão e inclusão –, portanto, requererá que sejamos bilíngues em certo sentido, aprendendo a falar nossa mensagem em linguagem secular, usando ideias e argumentos seculares. Nosso objetivo é descobrir valores éticos comuns, sem que nos tornemos menos cristãos na medida em que o façamos.30
Conteúdo
Não se trata de inventar outro evangelho, mais moderno ou atualizado, mas sim fazer com que o evangelho de sempre se conecte com os temas e preocupações atuais. Trata-se de outra ênfase. Cada época tem seus próprios temas incandescentes. Na época do Êxodo não era possível falar de salvação sem ligá-la à escravidão. Na época de Jesus era preciso falar de moralidade sexual, por isso os discípulos perguntaram sobre o divórcio e sobre os eunucos. Para a samaritana, entretanto, os temas mais marcantes eram outros: a água e onde adorar, e Jesus não somente começou com esses temas, mas relacionou ambos com a salvação. Hoje em dia, as pessoas entendem que a salvação está vinculada, entre outros temas, com a ecologia, com a identidade sexual pessoal, com Jesus Cristo e com a plenitude de vida. Esses são alguns dos temas pelos quais não podemos passar despercebidos, ao contrário, devemos começar por eles. Claro que na caminhada cristã os discípulos aprenderão a relacionar todos os demais temas bíblicos com suas vidas e com as circunstâncias, mas comecemos por aqueles temas que trazem mais preocupação. Imediatamente, o evangelho ressoará como a boa-nova.31
Não há oposição a opções morais e religiosas
A característica pluralista da sociedade atual faz com que ela seja muito tolerante às várias opções morais e religiosas. Por outro lado, reage contrariamente a todo intento de desacreditar ou criticar outras posturas. A pós-modernidade tolera muito mal as religiões que são contra outras opções além de suas próprias crenças. Por isso, alguns intentos de promover a visão cristã a respeito da sexualidade e das posições LGBTI+ têm encontrado forte resistência não tanto pelo seu conteúdo (também por ele), mas especialmente pela sua forma, seu marco mental: entende-se que os evangélicos estão sempre contra as ideias que não correspondem ao que creem. Outra vez trata-se de aprender a comunicar as verdades bíblicas com um enfoque que esteja de acordo com o tempo atual, de uma forma positiva.32 Nós, cristãos, temos muito o que contribuir em temas de justiça, de bem-estar social compartilhado, de integração, de identidade pessoal e coletiva, de ética etc. Todos esses compromissos positivos com a sociedade em geral são também formas de evangelizar e de contribuir.
Um exemplo notável dos séculos 19 e 20 foi a prática dos missionários e das igrejas na Espanha que, ao fundarem uma igreja, fundavam também uma escola; escolas de vanguarda da melhor qualidade. Eles souberam contribuir para uma necessidade essencial da sociedade daquele momento.33 Hoje em dia, a questão é a mesma. A igreja de Jesus Cristo deve contribuir não somente para a salvação integral das pessoas, mas também para a redenção da sociedade. Isso é boa-nova. Por isso, depois de ver, ouvir e entender, precisamos perguntar: qual é a necessidade importante da nossa sociedade para a qual a igreja quer/deve contribuir hoje?34
(3) Liturgia
A terceira característica da missão de hoje está relacionada à liturgia. Para o pós-moderno, “o meio é a mensagem” segundo a famosa frase de Marshall McLuhan. Isso significa que a embalagem é tão importante quanto o conteúdo, justamente o oposto do que assume a mentalidade moderna (para a qual o conteúdo é fundamental). As ferramentas típicas da missiologia, a teoria da comunicação, a antropologia cultural e a contextualização, já não são suficientes. Myers aponta:
Creio que é necessário um esforço muito maior para vincular as novas demandas da missão do século 21 com a revitalização e enriquecimento da adoração e da formação espiritual. As ferramentas tradicionais da missão – teoria da comunicação, habilidades interculturais e uma compreensão da contextualização – por si só não parecem estar à altura do desafio.35
Diante das liturgias seculares da nova religião sem nome, a igreja de hoje necessita formar especialistas em liturgia capazes de comunicar e informar por meio de símbolos, rituais, cerimônias, cores etc. O propósito dessa liturgia missional é criar identidade e interiorizar significados. Serve para fixar os valores do reino de Deus e dar a eles sentido em formatos culturais atuais. A santa ceia e o batismo são cerimoniais poderosíssimos, e eles devem fazer parte da missão do novo discipulado e considerar todos os que viemos descrevendo. São necessárias, dessa maneira, novas canções que reafirmem a identidade do ser humano, seu papel na criação e na sociedade, seu aspecto relacional. Canções que construam e reafirmem a identidade bíblica, que constitui o verdadeiro antídoto à antropologia deficiente da globalização e do mercado totalizante. A comunhão cristã e a unidade de todo o povo de Deus, que superam barreiras de todo o tipo, também devem ser anunciadas, exemplificadas e interiorizadas por meio da liturgia e de rituais espirituais.36
Conscientes dessa necessidade missionária, alguns seminários e faculdades de teologia ocidentais estão oferecendo cursos atualizados de liturgia. Um exemplo de riqueza litúrgica que estabelece vínculos e significados encontramos na celebração do 100º Centenário da Conferência Missionária de Edimburgo (2010), coordenada por Claudio Carvalhaes, professor de liturgia e culto no Louisville Presbyterian Theological Seminary.
Concluo esta seção com outra citação de Myers, que se aprofundou magistralmente na globalização e na resposta cristã a ela:
Os discípulos devem estar facultados para discernir e desmascarar o poder sedutor e as promessas da globalização. Devem ser capazes de compreender quem é o que faz com que essas tentações sejam tão poderosas e sedutoras. Há um mentiroso neste mundo; os enganos dos globalismos gêmeos da globalização não são acidentais. Os discípulos devem estar conscientes da natureza sedutora dos principados e poderes, e ter o discernimento e a espiritualidade para se oporem à sedução da idolatria e das falsas promessas. (cap. 14 | Pos. 600,7).37
Conclusão
Tratamos de descrever alguns aspectos-chave com respeito ao discipulado que o século 21, globalizado, secular e pluralista, necessita. Para isso, aludimos a um modelo renovado e ampliado de missão. Analisamos algumas das mudanças do mundo atual que afetam diretamente a fé e a religião. Mencionamos sucintamente algumas características da globalização, tudo para contribuir com uma proposta para ver, ouvir e entender nossa sociedade. Essa proposta foi elaborada com base em três aspectos: um conceito ampliado e renovado de discipulado; um novo enfoque da evangelização para que – outra vez – seja o que deve ser: boa-nova; e uma renovação da liturgia.
Sobre o autor
Christian Giordano é um missiólogo, pastor e professor espanhol. Dedicou mais de quatro décadas ao estabelecimento de novas igrejas na Espanha e no mundo islâmico. Escreveu vários livros e artigos. Ensina na Faculdade de Teologia das Assembleias de Deus e no Seminário Palmer (Eastern University). É membro da Comissão de Missões da Aliança Evangélica Mundial.
–x–
Este artigo foi publicado originalmente em espanhol por Christian Giordano em 2019 em https://losgiordano.org/wp-content/uploads/2020/06/Giordano-2019_Discipulado-globalizacion.pdf. O Martureo recebeu do autor autorização para traduzi-lo e republicá-lo. Tradução: Monica de Mesquita. Edição: Fernanda I. Schimenes.
Notas
1 Veja, entre outros, C. René Padilla, Misión Integral: Ensayos sobre el Reino y la Iglesia (Grand Rapids Mich.: Nueva Creación /W.B. Eerdmands, 1986); C. René Padilla, «La iglesia local, agente de transformación integral», 2003, 1-37. Esse também foi o enfoque do CETI (Centro Estudios Teológicos Interdisciplinarios): Ruth I. Padilla DeBorst, «Integral Mission Formation in Abya Yala (Latin America): A Study of the Centro de Estudios Teológicos Interdisciplinarios (1982-2002) and Radical Evangélicos» (Dr / PhD, Boston Univ., 2016).
2 Pedro Arana Quiroz, Samuel Escobar y C. René Padilla, El Trino Dios y la Mision Integral, 1a ed. (Buenos Aires: Ediciones Kairos, 2003), 65, 72.
3 CWME (CMME), «Publicado el “Llamamiento de Arusha al discipulado” – Consejo Mundial de Iglesias», 13 de maço de 2018.
4 Para ilustrar esse ponto, veja o comentário pertinente de Malina: “Imagine se você estivesse sentado em uma praça palestina no primeiro século e um grupo de pessoas perguntasse ao seu mestre: ‘Senhor, e os eunucos?’.” Bruce J. Malina, The New Testament World: Insights from Cultural Anthropology, 3rd edition, 3 Rev Exp (Louisville, KY: Westminster John Knox Press, 2001), introdução.
5 Veja meu artigo a respeito: Christian Giordano, «Paradigmas misioneros: Reflexiones en torno a CLAME 09», Misiopedia.com, agosto de 2010. Assim como este outro artigo meu em: Timóteo Carriker, ed., Biblia de estudio la misión de Dios (Tamboré, SP, Brasil: Sociedades Bíblicas Unidas, 2017), 1135, https://www.academia.edu/36154269/Paradigmas_misioneros.
6 Certamente há cristãos do Sul global que, por diversas razões (econômicas, climáticas, guerras etc.), mudam-se para o Norte embuídos de um louvável espírito missionário. Esse dado, contudo, ainda que seja importante, não modificou as pressuposições do modelo missionário do cristianismo.
7 Preferi chamar de “nova modernidade” em vez de pós-modernidade porque essa última definitivamente não afeta o chamado Mundo dos Dois Terços. A pós-modernidade é um fenômeno típico do Ocidente, contudo os elementos básicos que estou descrevendo afetam igualmente todo o mundo.
8 Veja, entre muitos outros: Joan Majó, «El ‘homo tecnologicus’», El País.com | Opinión, set de 2014, Catalunya edición, sec. Opinión. Assim como a apresentação do filósofo italiano Stefano Morrigi em seu livro Perché la tecnologia ci rende umani (Sironi), Stefano Morrigi y Il Giornale, «Homo tecnologicus, ultima frontiera della specie», Il Giornale.it, 12 de marzo de 2010, online edición, sec. Cultura.
9 Veja Hugo Assmann y Franz J Hinkelammert, A idolatria do mercado, 50 vols., Coleção Teologia e libertação. Série V, Desafios da vida na sociedade 5 (Petrópolis: Vozes, 1989); Hugo Assmann, «Por una sociedad donde quepan todos», Pasos | DEI, 15 de dezembro de 1996; Jung Mo Sung, Teología y economía: repensando la teología de la liberación y utopías (Madrid: Nueva Utopía, 1996); «Nova forma de legitimação da economía», Teologia em diálogo: I Simpósio Teológico Internacional da UNICAP (Universidade Católica de Pernambuco), ed. Degislando N. de Lima y Jacques Trudel (São Paulo, SP, Brasil: Paulinas, 2002), 19-51; «The human Being as Subject: Defending the victims», Latin American Liberation Theology: The Next Generation, ed. Ivan Petrella (Maryknoll, N.Y.: Orbis Books, 2005), 1-19; «Mercado religioso e mercado como religião», Horizonte 12, no 34 (25 de junho de 2014): 290-315; «El pobre después de la teología de la liberación», Concilium: Revista internacional de teología, no 361 (2015): 79-90. Veja também o Llamado de Arusha al Discipulado, Risto Jukko y Jooseop Keum, eds., Moving in the Spirit (Genève: WCC / CWME, 2019), 2.
10 J. Samuel Escobar Aguirre, Cómo comprender la misión: de todos los pueblos a todos los pueblos (Barcelona, Buenos Aires, La Paz, Lima: Certeza Unida, 2008), 67.
11 “Estima-se que 87% das mulheres do planeta estejam afiliadas a uma religião (grupo de fé) porque a fé representa um papel crucial na vida das mulheres”, como indica a apresentação principal “Transforming Disciples, Transforming the Future” [“Transformando Discípulos, Transformando o Futuro”] da Conferência de Arusha, citando dados do Pew Research Center’s Religion & Public Life Project. Jukko y Keum, Moving, 67.
12 Um grupo pequeno de 6 a 10 conglomerados empresariais que controlam 90% da comunicação mundial por rádio, jornal, TV, cabo e cinema. Veja: https://es.wikipedia.org/wiki/Conglomerado_mediático e https://www.investopedia.com/stock-analysis/021815/worlds-top-ten-media-companies-dis-cmcsa-fox.aspx.
13 C. René Padilla, Misión Integral: Ensayos sobre el reino de Dios y la iglesia, 3a.ed. (Buenos Aires: Kairos Ediciones, 2012), 53-54.
14 Autores de Wikipedia, «Globalización», em Wikipedia, la enciclopedia libre, 11 de novembro de 2019, https://es.wikipedia.org/wiki/Globalización.
15 Significado de «Globalización» no Diccionario de la Lengua Española, Versión 23.2 en línea (Online: RAE, 10 de setembro de 2019).
16 Bryant L Myers, Engaging Globalization: The Poor, Christian Mission, and Our Hyperconnected World, Mission in Global Community (Grand Rapids, MI: Baker Academic, 2017), cap. 12.
17 Autores de Wikipedia, «Homo economicus», en Wikipedia, la enciclopedia libre, 12 de julho de 2019, https://es.wikipedia.org/w/index.php?title=Especial:Citar&page=Homo_œconomicus&id=117365538. Assim como em: https://www.behavioraleconomics.com/resources/mini-encyclopedia-of-be/homo-economicus/
18 Myers, Engaging Globalization, cap. 13, pos. 5200.
19 Veja uma explicação detalhada das razões subjacentes para esse contraponto em: David W. Shenk, Global Gods: Exploring the Role of Religions in Modern Societies, 2ª ed. (Scottdale, PA, USA: Herald Press, 1999), 314-15.
20 Veja, entre outros: C. René Padilla, «From Lausanne I to Lausanne III», Journal of Latin American Theology, 2010; Valdir Raul Steuernagel, «The theology of mission in its relation to social responsibility within the Lausanne Movement» (Th.D., Lutheran School of Theology, 1988); Lars Dahle, Margunn Serigstad Dahle, y Knud Jørgensen, eds., The Lausanne Movement: A range of perspectives, vol. 22, Edinburg Centenary Series (Oxford, UK: Regnum Books, 2014); Al Tizon, Transformation after Lausanne: Radical Evangelical Mission in Global-Local Perspective, Regnum Studies in Mission (Carlisle, UK and Waynesboro, GA: Regnum, 2008).
21 Andy Wickham, «Un enfrentamiento de cosmovisiones en España: Cristianismo evangélico moderno contra secularismo postmoderno», 31 de outubro de 2006, 3.
22 Uma descrição detalhada das tendências e ferramentas da hermenêutica estão além do escopo deste artigo, mas algumas fontes de consulta poderiam ser: Zygmunt Bauman, La hermenéutica y las ciencias sociales, trad. Víctor Magno Boyé (Buenos Aires: Nueva Visión, 2007); Hermeneutics and Social Science: Approaches to Understanding, 1ª ed., Routledge Revivals (Londres: Routledge, 2010), https://doi.org/10.4324/9780203849460; Zygmunt Bauman y Maya Anguiluz Ibargüen, Modernidad y ambivalência, Autores, texto y temas: Ciencias Sociales 44 (Rubí, Barcelona: Anthropos Editorial, 2005); José Severino Croatto, Liberacion y libertad: pautas hermeneuticas (Lima, 1980); Hans de Wit, En la dispersión el texto es patria: introducción a la hermenéutica clásica, moderna y posmoderna (San José, Costa Rica: Universidad Bíblica Latinoamericana, 2002); J. Hans de Wit, «“¡Dios mío” dijo “qué loca soy en los buques!”: Alteridad e infinitud en perspectiva hermenéutica», Acta Poética 31, no 2 (2010): 19-54; Editors of Encyclopaedia Britannica, «Hermeneutics | Definition & Facts», Encyclopedia Britannica (Encyclopedia Britannica, 7 de dezembro de 2017), https://www.britannica.com/topic/hermeneutics-principles-of-biblical-interpretation; C. Mantzavinos, «Hermeneutics», The Stanford Encyclopedia of Philosophy, ed. Edward N. Zalta (Stantford, Palo Alto, CA: Metaphysics Research Lab, Stanford University, 2016), https://plato.stanford.edu/archives/win2016/entries/hermeneutics/; Ángel Pérez y Darío Alberto, «Hermeneutics and research methods of Social Science», Estudios de Filosofía, no 44 (dezembro de 2011): 7-7; Charlene Van der Walt, Toward a communal reading of 2 Samuel 13: ideology and power within the intercultural Bible reading process, Intercultural biblical hermeneutics series, Fall 2014, Number 2 (Elkhart, IN: Institute of Mennonite Studies | Foundation Dom H. Camara Chair, VU Univ. Amsterdam, 2014).
23 Ainda que, à primeira vista, possa parecer que os líderes evangélicos do sul da Europa tenham certa dificuldade de captar essa visão ampliada da hermenêutica, tal tarefa não deveria ser muito difícil para eles dado o embasamento teórico que já têm da hermenêutica aplicada à Bíblia. Pode-se dizer que eles provavelmente seriam os candidatos em melhor posição para lidar com as ferramentas para ver, ouvir e entender suas sociedades, o que, por si só, é algo que traz esperança.
24 Myers, Engaging Globalization, cap. 14, pos. 593,1.
25 Veja a entrevista “How can you preach to both Christians and non-Christians?” de Helder Favarin em: The Forum of Christian Leaders online, EFL interviews (Wheaton, IL, 2017). A entrevista aconteceu no contexto mais amplo da apresentação de Favarin “Rethinking Evangelistic Preaching in Europe” do Fórum de Líderes Cristãos de 2017. Veja também uma breve biografia atualizada de Helder Favarin em: https://www.gbu-es.org/forum/helder-favarin/.
26 Alpha foi fundado em Londres 1990 no seio de uma igreja anglicana. Trata-se de um programa de estudo bíblico em 10 semanas por meio do qual as pessoas vão descobrindo a respeito de Jesus por si próprias em um grupo de estudo da Bíblia. Seus fundadores logo perceberam que muitos cristãos também estava interessados em participar. Alpha é amplamente utilizado por católicos, anglicanos, protestantes e ortodoxos. Veja: https://alpha.org.
27 Ross Rohde, «Evangelio y Posmodernismo en España», Misiopedia.com, julho de 2007, 17, http://missiopedia.com/documentos/pdf/posmodernismoes.pdf. Lamentavelmente o link não está ativo, mas o artigo está disponível mediante solicitação ao autor.
28 Gary W Kuhne, La dinámica de adiestrar discípulos (Miami, FL.: Editorial Betania, 1980); Phillip Vogel, Go and Make Apprentices (Eastbourne: Kingsway Publications, 1986). Veja também o recente: John R. W Stott, El discípulo radical: Aspectos del discipulado que con frecuencia se descuidan (Barcelona, Buenos Aires, La Paz, Lima: Certeza Unida, 2012).
29 Wickham, «Enfrentamiento de cosmovisiones», 8.
30 Myers, Engaging Globalization, 250.
31 Para ampliar esse assunto – os vários enfoques do evangelho – e como cada cultura reage de forma diferente frente ao pecado, veja: Roland Muller, Honor y Vergüenza: Una cosmovisión por descubrir, ed. Marvel Landaverde, trad. Natasha Dancy (Málaga, España: IIBET, 2016); The Messenger, The Message, The Community: Three Critical Issues for the Cross-Cultural Church-Planter (Saskatchewan, Canada: CanBooks, 2006), www.canbooks.com; Jayson Georges, El Evangelio en 3D: Como presentar el evangelio en las culturas de la culpa, la vergüenza y el temor (Bogotá: Desafío Editorial, 2016); Carlos González, «Tres grandes bloques culturales», 2004.
32 Wickham propõe deixar de lado “a mentalidade de atacar e defender, …usar a ética e a moral,… compartilhando o evangelho como vida em vez de como informação, …sem tentar convencer ou coagir”, Wickham, «Enfrentamiento de cosmovisiones». Rohde igualmente argumenta contra o “negativismo, …verdades inflexíveis”, e insiste em encontrar pontes que busquem “espiritualidade, …relações de discipulado, … e se concentrar em disciplinas espirituais”, Rohde, «Evangelio y Posmodernismo en España».
33 Veja, entre outros conteúdos, esta obra de um pastor especialista: Juan Manuel Quero Moreno, «El protestantismo en la renovación del sistema educativo de España» (Tesis doctoral, Universidad Complutense de Madrid, Servicio de Publicaciones, 2009); Historia del Protestantismo en España: Los Colegio Evangélicos, 2a ed. ampliada (Autopublicado: Juan Manuel Quero, 2017).
34 Sem dúvida, a importante ajuda social que as igrejas evangélicas ofereceram às pessoas mais vulneráveis desde a crise de 2009 até agora é um exemplo notável de contribuição à sociedade. Deve ser a única? Veja outra reportagem aqui.
35 Myers, Engaging Globalization, 251.
36 Para considerar vantagens, possibilidades e também limites para rituais espirituais, veja: Marianne Moyaert y Joris Geldhof, Ritual Participation and Interreligious Dialogue: Boundaries, Transgressions and Innovations, 2016. Todo campo das disciplinas espirituais (silêncio, meditação, jejum, sujeição etc.) demanda cada vez mais atenção na espiritualidade cristã do século 21. Como exemplo: Richard J Foster, Alabanza a la disciplina (Eugene, Or.: Wipf & Stock Publishers, 2005).
37 Myers, Engaging Globalization, pos. 600,7.
Bibliografia (como no original)
Arana Quiroz, Pedro, Samuel Escobar y C. René Padilla. El Trino Dios y la Mision Integral. 1st ed. Buenos Aires: Ediciones Kairos, 2003.
Assmann, Hugo. «Por una sociedad donde quepan todos». Pasos | DEI, 15 de diciembre de 1996. http://www.globethics.net/gtl/5138058.
Assmann, Hugo, y Franz J Hinkelammert. A idolatria do mercado. 50 vols. Coleção Teologia e libertação. Série V, Desafios da vida na sociedade 5. Petrópolis: Vozes, 1989.
Autores de Wikipedia. «Carolina Marcial Dorado». En Wikipedia, la enciclopedia libre, 1 de marzo de 2018. https://es.wikipedia.org/w/index.php?title=Carolina_Marcial_Dorado&oldid=105907418.
______. «Globalización». En Wikipedia, la enciclopedia libre, 11 de noviembre de 2019. https://es.wikipedia.org/wiki/Globalización.
______. «Homo economicus». En Wikipedia, la enciclopedia libre, 12 de julio de 2019. https://es.wikipedia.org/w/index.php? title=Especial:Citar&page=Homo_œconomicus&id=117365538.
Bauman, Zygmunt. Hermeneutics and Social Science: Approaches to Understanding. 1.a ed. Routledge Revivals. Londres: Routledge, 2010. https://doi.org/10.4324/9780203849460.
______. La hermenéutica y las ciencias sociales. Traducido por Víctor Magno Boyé. Buenos Aires: Nueva Visión, 2007.
Bauman, Zygmunt, y Maya Anguiluz Ibargüen. Modernidad y ambivalencia. Autores, texto y temas: Ciencias Sociales 44. Rubí, Barcelona: Anthropos Editorial, 2005.
Carriker, Timóteo, ed. Biblia de estudio la misión de Dios. Tamboré, SP, Brasil: Sociedades Bíblicas Unidas, 2017.
Croatto, José Severino. Liberacion y libertad: pautas hermeneuticas. Lima, 1980. 37 Myers, Engaging Globalization, pos 600,7. Ch. Giordano Discipulado y globalización, nov. 2019 pág. 14
CWME (CMME). «Publicado el “Llamamiento de Arusha al discipulado” — Consejo Mundial de Iglesias». 13 de marzo de 2018. http://www.oikoumene.org/es/press-centre/news/arusha-call-to-discipleshipissued.
Dahle, Lars, Margunn Serigstad Dahle, y Knud Jørgensen, eds. The Lausanne Movement: A range of perspectives. Vol. 22. Edinburg Centenary Series. Oxford, UK: Regnum Books, 2014. http://www.ocms.ac.uk/regnum/downloads/The_Lausanne_Movement-Final-WMF.pdf.
Editors of Encyclopaedia Britannica. «Hermeneutics | Definition & Facts». En Encyclopedia Britannica. Encyclopedia Britannica, 7 de diciembre de 2017. https://www.britannica.com/topic/hermeneuticsprinciples-of-biblical-interpretation.
Escobar Aguirre, J. Samuel. Cómo comprender la misión: de todos los pueblos a todos los pueblos. Barcelona, Buenos Aires, La Paz, Lima: Certeza Unida, 2008.
Favarin, Helder. How can you preach to both Christians and non-Christians? | The Forum of Christian Leaders online. EFL interviews. Wheaton, IL, 2017. https://foclonline.org/answer/how-can-youpreach-both-christians-and-non-christians.
Foster, Richard J. Alabanza a la disciplina. Eugene, Or.: Wipf & Stock Publishers, 2005.
Georges, Jayson. El Evangelio en 3D: Como presentar el evangelio en las culturas de la culpa, la vergüenza y el temor. Bogotá: Desafío Editorial, 2016.
Giordano, Christian. «Paradigmas misioneros: Reflexiones en torno a CLAME 09». Misiopedia.com, agosto de 2010. https://docplayer.es/46277645-Paradigmas-misioneros.html.
González, Carlos. «Tres grandes bloques culturales», 2004. http://www.losgiordano.org/My_Homepage_Files/Download/TresBloquesCulturales.pdf.
Jukko, Risto, y Jooseop Keum, eds. Moving in the Spirit: Genève: WCC / CWME, 2019. https://www.oikoumene.org/en/resources/publications/MovingintheSpirit.pdf.
Kuhne, Gary W. La dinámica de adiestrar discípulos. Miami, FL.: Editorial Betania, 1980.
Majó, Joan. «El ‘homo tecnologicus’». El País.com | Opinión. set de 2014, Catalunya edición, sec. Opinión. https://elpais.com/ccaa/2014/09/30/catalunya/1412104162_009832.html.
Malina, Bruce J. The New Testament World: Insights from Cultural Anthropology 3rd edition. 3 Rev Exp. Louisville, KY: Westminster John Knox Press, 2001.
Mantzavinos, C. «Hermeneutics». En The Stanford Encyclopedia of Philosophy, editado por Edward N. Zalta. Stantford, Palo Alto, CA: Metaphysics Research Lab, Stanford University, 2016. https://plato.stanford.edu/archives/win2016/entries/hermeneutics/.
Morrigi, Stefano, y Il Giornale. «Homo tecnologicus, ultima frontiera della specie». Il Giornale.it. 12 de marzo de 2010, online edición, sec. Cultura. http://www.ilgiornale.it/news/homo-tecnologicusultima-frontiera-specie.html.
Moyaert, Marianne, y Joris Geldhof. Ritual Participation and Interreligious Dialogue: Boundaries, Transgressions and Innovations, 2016.
Muller, Roland. Honor y Vergüenza: Una cosmovisión por descubrir. Editado por Marvel Landaverde. Traducido por Natasha Dancy. Málaga, España: IIBET, 2016.
______. The Messenger, The Message, The Community: Three Critical Issues for the Cross-Cultural Church-Planter. Saskatchewan, Canada: CanBooks, 2006. www.canbooks.com.
Myers, Bryant L. Engaging Globalization: The Poor, Christian Mission, and Our Hyperconnected World. Mission in Global Community. Grand Rapids, MI: Baker Academic, 2017.
Padilla, C. René. «From Lausanne I to Lausanne III». Journal of Latin American Theology, 2010.
______. «La iglesia local, agente de transformación integral», 1-37, 2003. http://ftl-al.org/clade5/docs/consultas_tematicas/La_iglesia_local/La_iglesia_local_-_Padilla.pdf.
______. Misión Integral: Ensayos sobre el reino de Dios y la iglesia. 3a.ed. Buenos Aires: Kairos Ediciones, 2012.
______. Misión Integral: Ensayos sobre el Reino y la Iglesia. Grand Rapids Mich.: Nueva Creación /W.B. Eerdmands, 1986.
Padilla DeBorst, Ruth I. «Integral Mission Formation in Abya Yala (Latin America): A Study of the Centro de Estudios Teológicos Interdisciplinarios (1982-2002) and Radical Evangélicos». Dr / PhD, Boston Univ., 2016. https://open.bu.edu/handle/2144/18651. Ch. Giordano Discipulado y globalización, nov. 2019 pág. 15
Pérez, Ángel, y Darío Alberto. «Hermeneutics and research methods of Social Science». Estudios de Filosofía, n.o 44 (diciembre de 2011): 7-7. http://www.scielo.org.co/scielo.php? script=sci_abstract&pid=S0121-36282011000200002&lng=en&nrm=iso&tlng=en.
Piñon Varela, Piñón. «Go West Young Woman! Redes transatlánticas e internacionalismo cultural. Las mujeres como protagonistas del intercambio académico entre España y los Estados Unidos (1919- 1939)». Tesis doctoral, UNED, 2016. http://e-spacio.uned.es/fez/view/tesisuned:CiencPolSocPipinon.
Quero Moreno, Juan Manuel. «El protestantismo en la renovación del sistema educativo de España». Tesis doctoral, Universidad Complutense de Madrid, Servicio de Publicaciones, 2009. http://eprints.ucm.es/8784/.
______. Historia del Protestantismo en España: Los Colegio Evangélicos. 2a ed. ampliada. Autopublicado: Juan Manuel Quero, 2017.
RAE. «Globalización». En Diccionario de la Lengua Española. Versión 23.2 en línea. Online: RAE, 10 de septiembre de 2019.
Rohde, Ross. «Evangelio y Posmodernismo en España». Misiopedia.com, julio de 2007. http://missiopedia.com/documentos/pdf/posmodernismoes.pdf.
Shenk, David W. Global Gods: Exploring the Role of Religions in Modern Societies. 2.a ed. Scottdale, PA, USA: Herald Press, 1999.
Steuernagel, Valdir Raul. «The theology of mission in its relation to social responsibility within the Lausanne Movement». Th.D., Lutheran School of Theology, 1988.
Stott, John R. W. El discípulo radical: Aspectos del discipulado que con frecuencia se descuidan. Barcelona, Buenos Aires, La Paz, Lima: Certeza Unida, 2012.
Sung, Jung Mo. «El pobre después de la teología de la liberación». Concilium: Revista internacional de teología, n.o 361 (2015): 79-90. https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=5115469.
______. «Mercado religioso e mercado como religião». Horizonte 12, n.o 34 (25 de junio de 2014): 290-315. https://doi.org/10.5752/P.2175-5841.2014v12n34p290.
______. «Nova forma de legitimação da economía». En Teologia em diálogo: I Simpósio Teológico Internacional da UNICAP (Universidade Católica de Pernambuco), editado por Degislando N. de Lima y Jacques Trudel, 19-51. São Paulo, SP, Brasil: Paulinas, 2002.
______. Teología y economía: repensando la teología de la liberación y utopías. Madrid: Nueva Utopía, 1996.
______. «The human Being as Subject: Defending the victims». En Latin American Liberation Theology: The Next Generation, editado por Ivan Petrella, 1-19. Maryknoll, N.Y.: Orbis Books, 2005. https://www.academia.edu/5259533/The_Human_Being_as_Subject_Defending_the_Victims_-_Liberation_Theology_Next_Generation
Tizon, Al. Transformation after Lausanne: Radical Evangelical Mission in Global-Local Perspective. Regnum Studies in Mission. Carlisle, UK and Waynesboro, GA: Regnum, 2008.
Van der Walt, Charlene. Toward a communal reading of 2 Samuel 13: ideology and power within the intercultural Bible reading process. Intercultural biblical hermeneutics series, Fall 2014, Number 2. Elkhart, IN: Institute of Mennonite Studies | Foundation Dom H. Camara Chair, VU Univ. Amsterdam, 2014.
Vogel, Phillip. Go and Make Apprentices. Eastbourne: Kingsway Publications, 1986.
Wickham, Andy. «Un enfrentamiento de cosmovisiones en España: Cristianismo evangélico moderno contra secularismo postmoderno», 31 de octubre de 2006.
Wit, Hans de. En la dispersión el texto es patria: introducción a la hermenéutica clásica, moderna y posmoderna. San José, Costa Rica: Universidad Bíblica Latinoamericana, 2002.
Wit, J. Hans de. «“¡Dios mío” dijo “qué loca soy en los buques!”: Alteridad e infinitud en perspectiva hermenéutica». Acta Poética 31, n.o 2 (2010): 19-54. https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=3973884.