Alá é Deus? – Parte 5

Artigos escritos a partir da polêmica iniciada na Wheaton College sobre se muçulmanos e cristãos adoram o mesmo Deus.

A seguir estão os ensaios 5 a 11 de um total de 23 que a EMS – Evangelical Missiological Society [Sociedade Missiológica Evangélica] publicou como uma edição especial do Occasional Bulletin em 2016.

Textos 1 a 3 disponíveis aqui.
Textos 4 a 7 disponíveis aqui.
Textos 8 a 11 disponíveis aqui.
Textos 12 a 15 disponíveis aqui.

 

Quem decide se Alá é Deus?

Uma consideração contextual do uso da palavra “Alá” para o Deus da Bíblia

Mark Naylor

Deus é um deus de acomodações. Ele nos fala em e por meio de nosso contexto, cultura e experiências diárias. É como se nos aculturássemos em uma linguagem e contexto particulares nos quais obtemos as ferramentas necessárias para nos envolvermos com Deus em oração e leitura das Escrituras. Como Newbigin[1] observa, recebemos “lentes” da nossa teia de relacionamentos através das quais nos envolvemos com o mundo. Logo, nossos conceitos sobre Deus são formados por tradições culturais e pela linguagem, e continuam a ser desenvolvidos a partir do diálogo à medida que envolvemos outros no estudo de Deus. A linguagem como comunicação pode ter significado apenas em [determinada] comunidade, e esses veículos localizados de comunicação são usados por Deus para [ele] se envolver com a humanidade. Por isso, Deus falou aos profetas do Antigo Testamento em hebraico, ao apóstolo Paulo em aramaico, e às igrejas espalhadas pelo Império Romano em grego. Quem vai a Deus em Cristo o percebe primeiro através das lentes que foram desenvolvidas em seu contexto cultural. Porque essas lentes derivam de humanos, elas ao mesmo tempo revelam e distorcem; são limitadas, mas são a única porta de entrada pela qual a humanidade pode se aproximar de Deus.

Tal perspectiva sugere que a questão de se o Deus do islã e o Deus do cristianismo são ou não o mesmo pode ser tratada a partir do exame de como as pessoas de contextos muçulmanos se aproximam de Cristo.

  • Como os muçulmanos que exploram e aceitam o evangelho se envolvem com a mensagem de Jesus através de sua visão de Deus?
  • Alá permanece o mesmo para eles, mas com um entendimento reformulado, ou eles o abandonam para abraçar um Deus totalmente diferente?
  • Como o conceito que os muçulmanos têm de Deus se compara e contrasta com o do Pai de Jesus?
  • À medida que eles vêm para a fé, as semelhanças são suficientes para que a identidade de Deus permaneça constante em seu entendimento, ou há um ponto em que eles transferem a lealdade para outro Deus?

Abdul (o nome foi modificado) nos visitava regularmente para estudar a Bíblia. Líamos um capítulo de Romanos cada vez que ele vinha, e, no final do capítulo 9, ele se virou para mim e declarou: “Eu agora creio que Jesus é o Filho de Deus, mas, e quanto ao islã?”. Eu tinha experiência suficiente para entender o significado da pergunta dele. O que ele queria dizer é que tinha grande amor e respeito para com o islã e seu Deus, e se questionava sobre como a religião de sua família, que tinha lhe dado moralidade e estabilidade social, poderia ser agregada a um compromisso com Cristo. Dei-lhe o exemplo da interação de Jesus com o jovem rico (Lc 18.18-30) como um paralelo para a situação dele: um homem com lealdade para com uma religião bastante respeitada, mas que estava insatisfeito espiritualmente. O jovem rico na história era fiel aos seus deveres religiosos, mas mesmo assim tinha fome por algo a mais que seu caminho de obediência poderia lhe proporcionar. A comparação teve ressonância em Abdul, e, assim como Jesus chamou aquele homem na história para segui-lo sem rejeitar os bons aspectos de sua religião, Abdul comprometeu sua vida com Cristo como a maneira de conhecer e amar o Alá que ele fora ensinado a servir.

Essas experiências me levaram a examinar o processo de conversão de muçulmanos em minha área de ministério. Em 2013, defendi minha tese de doutorado[2], que examinou “trajetórias teológicas” de muçulmanos que vieram à fé em Cristo. Levantei a questão: “Como a perspectiva de Deus que eles têm mudou?”. Tanto o grupo controle [padrão para comparação em um experimento] de muçulmanos como o grupo daqueles que se tornaram seguidores de Jesus refletiam a narrativa do filho pródigo (Lucas 15) para expressar como o caráter e a natureza de Deus foram revelados. Durante o exercício, nenhum grupo questionou a identidade de Deus, ou tentou distinguir um Deus cristão de um Deus muçulmano. Para todos os participantes, Deus é um, e a questão da identidade do Pai de Jesus como Alá estava fora do domínio da possibilidade ou até mesmo da discussão. O que mudou para os crentes foi sua orientação em relação a Deus e sua perspectiva de Deus. O grupo controle muçulmano era consistente em sua visão de Deus como Senhor e deles próprios como servos. Ainda que não rejeitando essa perspectiva, os que se tornaram seguidores de Cristo abraçaram uma nova forma de relacionamento: Deus como Pai e eles próprios como filhos amados.

Não se pode afirmar que essas descobertas refletem [a visão] de todos os muçulmanos que vieram a confessar a fé em Cristo, apenas a dos que foram objeto desse estudo. Não obstante, parece evidente – nesse e em outros estudos ao redor do mundo[3] – que muitos muçulmanos vão a Cristo sem mudar sua fidelidade para com outro Deus. A perspectiva deles é alterada na medida em que entendem Deus em Cristo, mas a identidade do Criador divino permanece intacta. A partir de uma perspectiva missiológica, a melhor resposta para “Alá é Deus?” não é determinada pelo entendimento dos que estão fora, mas pelo dos que estão dentro. Por ser a resposta orientada segundo o receptor, não há uma [única] resposta correta uma vez que ela se baseia na compreensão que determinado indivíduo ou grupo de pessoas têm de Alá. Se essa experiência de Deus for negativa e amarga, e o amor de Cristo é visto de forma contrastante com a compreensão que eles têm, eles poderão virar as costas para Alá a fim de abraçar o Deus servo que se preocupa com todas as nações.[4] Por outro lado, se amam o Deus do islã que é gracioso, misericordioso e perdoador, mas se sentem distantes dele, então o convite de Cristo como o caminho, a verdade e a vida que nos leva para um relacionamento vivo com o Pai tem um apelo como a estrada [pathway] para conhecer Alá. Deus permanece o mesmo, a orientação em relação a ele é que muda.

[1] Lesslie Newbigin, The Gospel in a Pluralist Society (Grand Rapids: Wm. B. Eerdmans, 1989), p. 38. O Evangelho em uma sociedade pluralista. (Viçosa: Ultimato, 2016).

[2] Mark Naylor, Mapping Theological Trajectories That Emerge In Response To A Bible Translation (Não publicada, 2013).

[3] Understanding Insider Movements: Disciples of Jesus within Diverse Religious Communities, editado por Harley Talman e John Jay Travis (Pasadena: Wm. Carey, 2015), apresenta grande número de exemplos.

[4] Nabeel Qureshi é um convertido do islã que representa essa posição. Consulte seu artigo “Do Muslims and Christians Worship the Same God” em http://rzim.org/global-blog/do-muslims-and-christians-worship-the-same-god. Acesso em: 2 de janeiro de 2016.

Sobre o autor
Mark Naylor, canadense, foi missionário junto a um povo muçulmano por 14 anos, e continua um projeto de tradução da Bíblia iniciado em 1989. Atualmente é do corpo docente do Northwest Baptist Seminary em Langley, Columbia Britânica (Canadá), e é Coordenador do International Leadership Development [Desenvolvimento de Liderança Internacional] da Fellowship Baptist Churches [Comunhão de Igrejas Batistas] no Canadá.

 

Cristãos e muçulmanos adoram o mesmo Deus?

Esclarecendo algumas questões

Harold Netland

Cristãos e muçulmanos adoram o mesmo Deus? O que parece uma pergunta simples com uma resposta clara na verdade é uma questão ambígua e aberta a múltiplas interpretações e agendas. Para os cristãos americanos, o ponto focal dessas agendas está nas percepções conflitantes quanto ao islã. Para alguns, o islã é uma religião de paz, e é óbvio que cristãos e muçulmanos adoram o mesmo Deus. Outros (incluindo muitos evangélicos) consideram igualmente óbvio que o islã é maligno, e que o “Alá” do islã não tem nada em comum com o Deus do cristianismo. Infelizmente, eventos das três últimas décadas produziram nos EUA um ambiente carregado em termos políticos e sociais a tal ponto que questões teológicas e missiológicas importantes a respeito do islã com frequência se confundem com preocupações a respeito de terrorismo e segurança nacional. Devido à globalização, é crucial que os líderes evangélicos norte-americanos sejam mais sensíveis à complexidade do mundo cultural e religiosamente diverso, e fiquem mais à vontade para desatar questões missiológicas complexas.

No que se segue, vou focar na seguinte questão: (A) cristãos e muçulmanos adoram o mesmo Deus?

Há muitas questões missiológicas significativas envolvidas em (A), mas vou me limitar a esclarecer o que pode estar envolvido ao levantar a pergunta. Ao assim fazer, contudo, vou localizar (A) dentro do conjunto mais amplo de questões missiológicas oriundas da contextualização, e concluir sugerindo que as questões levantadas por (A) não são exclusivas a encontros inter-religioso, mas também estão presentes em debates internos entre cristãos.

O contexto missiológico mais amplo da questão

A questão (A) não é nova para os cristãos. É um exemplo de um conjunto mais amplo de questões que têm a ver com a relação do evangelho cristão com os contextos cultural e religioso circundantes com os quais os cristãos têm lutado por séculos. Em qual extensão há semelhança de significado entre termos e conceitos bíblicos e locais? Por exemplo, jesuítas e dominicanos na China no século 17 debateriam sobre ser ou não correto usar o antigo termo chinês Shang Di para se referir ao Deus da Bíblia. Alguns jesuítas argumentaram: o que os antigos confucionistas adoraram como Shang Di era o Deus bíblico. Mas os dominicanos e franciscanos negaram [que se tratava do mesmo Deus]. De igual maneira, no fim do século 19, houve extensos debates entre missionários na Coreia a respeito de ser correto ou não usar o termo Hananim para o Deus bíblico, e, entre os missionários no Japão, houve uma discussão quanto a se usar ou não o termo xintoísta kami para o Deus da Bíblia. O polêmico debate contemporâneo a respeito dos “movimentos internos” [insider movements] e das abordagens C4 e C5 no ministério com muçulmanos refere-se em parte ao grau de continuidade no significado entre temas cristãos e certos termos, ensinos ou práticas em contextos islâmicos. A contextualização da mensagem do evangelho pressupõe que há continuidade entre as compreensões bíblicas e o idioma nativo [onde a missão está sendo realizada], mesmo quando pressuposições inaceitáveis são rejeitadas.

É significativo que evangélicos norte-americanos tendam a usar a palavra árabe “Alá” para se referir ao Deus do islã e a palavra inglesa “Deus” [God] para se referir ao Deus da Bíblia. Conquanto compreensível, isso não apenas acentua as diferenças percebidas entre o cristianismo e o islã como também ignora o fato de que cristãos de língua árabe usavam “Alá” para se referir ao Deus da Bíblia antes e depois do tempo de Maomé. Muitos cristãos hoje em todo o mundo continuam a fazê-lo. Traduções árabes da Bíblia hoje usam “Alá” para se referir ao Deus da Bíblia. Além disso, devemos nos lembrar que a palavra inglesa para Deus, God, é, em si, tradução de várias palavras hebraicas e gregas na Bíblia usadas para o único Criador. Insistir que “Deus” se refere à deidade bíblica mas “Alá” à deidade muçulmana obscurece essas realidades.

Questões características

Para esclarecer a ambiguidade em (A), devemos considerar as seguintes questões:

(1) Cristãos e muçulmanos concordam que tudo que existe, com exceção do Criador, foi criado por um eterno Deus Criador?

A resposta à (1) claramente é “sim”. Ontologicamente, isto é, em termos do que realmente existe, só pode existir um Deus Criador. Logo, o referente ontológico de “Criador” em (1) deve ser o mesmo para ambos, cristãos e muçulmanos. Nesse sentido, muçulmanos e cristãos estão se referindo ao mesmo ser divino quando falam a respeito de Deus o Criador. Mas é necessário prosseguir com a segunda questão a seguir.

(2) Cristãos e muçulmanos concordam em seus respectivos entendimentos de Deus?

Conquanto haja significativas concordâncias entre muçulmanos e cristãos com respeito a certos aspectos relacionados à natureza de Deus (Deus é onipotente e onisciente), há também discordâncias fundamentais quanto a esses aspectos. A discordância primária, evidentemente, é quanto à doutrina da trindade e da divindade de Jesus Cristo. Por isso, enquanto podemos responder à pergunta (1) afirmativamente, não podemos fazer o mesmo com a questão (2) sem qualificações significativas.

A questão (A) fala de cristãos e muçulmanos adorando o mesmo Deus. Entretanto, o que “adorar” significa aqui? Se inclui a ideia de estar em um relacionamento adequando, salvífico com Deus, então (A) deve ser entendida da seguinte maneira:

(3) Muçulmanos e cristãos, enquanto agem a partir das crenças fundamentais que estão

no núcleo de seus sistemas teológicos, estão em um relacionamento adequado, salvífico, com o único Deus Criador? (Muçulmanos que vivem fielmente de acordo com o ensino islâmico são salvos?)

Muitos evangélicos consideram inaceitável [afirmar que sim] à (3) a partir da Bíblia. O ponto importante aqui é que (A) pode ser interpretada em termos de qualquer uma das três questões subsidiárias, sendo que cada qual necessita ser tratada em seus próprios termos. Antes que se responda à questão (A), é preciso ter clareza quanto à pergunta que está sendo considerada.

Similaridades, diferenças e identidade

Responder à (A) envolve fazer um julgamento a respeito das relações de identidade entre os referentes dos dois conceitos. Sob que condições podemos concluir legitimamente que dois ou mais conceitos ou descrições se referem à mesma coisa? Claramente há muitos casos nos quais o mesmo indivíduo pode ser referido sob diferentes conceitos ou descrições. A mesma pessoa pode, por exemplo, ser descrita como o pai de Jim, o homem que ganhou a maratona de Chicago ano passado e o gerente da concessionária da Toyota. Algumas pessoas podem conhecê-lo sob uma descrição, mas outros, não; contudo, não há nada implausível a respeito de se sustentar que todas as descrições dizem respeito à mesma pessoa. Em outros casos, as descrições podem ser tais que não faz sentido sustentar que todas elas se referem ao mesmo indivíduo. Indo além, há casos em que nós simplesmente não conseguimos determinar se é a mesma pessoa.

Em um ensaio clássico, o filósofo Gottlob Frege estabeleceu uma distinção importante que é útil para discernir questões de identidade (Frege, 1952). Frege distinguiu entre a denotação (ou referência) e a conotação (ou sentido). Dois termos ou conceitos têm o mesmo referente ou denotação enquanto têm diferentes conotações ou sentidos. Frege observou que as afirmações “Estrela Matutina” e “Estrela Vespertina” têm o mesmo referente, ainda que as declarações divirjam significativamente em sentido:

(4) A Estrela Matutina é idêntica à Estrela Matutina.

(5) A Estrela Matutina é idêntica à Estrela Vespertina.

Ainda que agora saibamos que ambas as declarações são verdadeiras, e que em ambos os casos é o Planeta Vênus que está sendo referido (denotação), claramente há diferenças no sentido (conotação) em (4) e (5). Enquanto (4) é simples tautologia, e isso é obviamente verdade, houve um tempo no qual a verdade de (5) não era conhecida. Mas atualmente sabemos que, ainda que “Estrela Matutina” e “Estrela Vespertina” tenham diferentes sentidos, ambas têm o mesmo referente – o Planeta Vênus.

A questão, então, é se algumas das descrições de Alá no islã e de Deus no cristianismo podem plausivelmente ser entendidas como denotando o mesmo ser divino. Enquanto focamos na questão (1), isso faz sentido. Mas, se nos voltamos para (2), então não está tão claro que a denotação é a mesma. Por isso, é enganoso dar um simples “sim” ou “não” para (A). Dudley Woodberry sabiamente observa que “cristãos, muçulmanos e judeus como monoteístas referem-se ao mesmo ser quando mencionam Deus – o Deus Criador de Abraão, Ismael, Isaque e Jacó. Mas, de maneiras significativas, eles não têm o mesmo entendimento a respeito dele, ainda que concordem em pontos importantes” (Woodberry 2004, p. 37).

Também é importante manter a questão da identidade do referente de dois termos distinta da questão de se os que usam os termos estão adorando o mesmo Deus. O conceito de adoração inclui uma resposta disposicional ao objeto de adoração que será adequada ou inadequada (adoração genuína, falsa adoração, adoração em ignorância etc.). Assim, dois indivíduos podem usar termos diferentes para se referir à mesma realidade divina sem se envolver ou adorar aquela divindade.

Quanta diferença de significado é aceitável?

Não é só quando lidamos com a “religião dos outros” que nos confrontamos com o problema de diferenças em compreensões conceituais de Deus. Isso ocorre também no cristianismo. Por exemplo, mesmo quando os cristãos mais preparados teologicamente têm compreensões de Deus (compreensões essas que são, no mínimo, parciais e inadequadas [por conta das lentes que temos]), precisamos distinguir entre:

(6) Deus como ele é em realidade;

(7) Deus enquanto revelado na encarnação e nas Escrituras;

(8) As compreensões particulares de Deus que um indivíduo ou uma tradição teológica têm.

Ainda que (7) seja uma reflexão acurada de (6), ela é parcial no sentido de que há muito mais sobre Deus do que aquilo que nos foi revelado. E, devido à nossa finitude e pecado, sempre há espaços ou intervalos entre (8) e (7). Nosso alvo como discípulos maduros de Jesus Cristo, evidentemente, é trazer (8) em linha com (7) tanto quanto possível.

Mas, por conta das diferenças significativas de compreensões de Deus entre vários grupos cristãos, devemos perguntar se todos eles adoram o mesmo Deus. Por exemplo, leigos que frequentam uma igreja batista adoram o mesmo Deus de um teólogo batista que é professor em um seminário? Verdade seja dita, muitos em nossos bancos de igreja provavelmente acolhem ideias a respeito da Trindade e de Jesus Cristo que foram condenadas historicamente como heréticas. Atanásio e Ário adoravam o mesmo Deus? O que dizer de calvinistas e arminianos? Jonathan Edwards e Clark Pinnock? Nossas compreensões de Deus são, até certo ponto, influenciadas por nosso contexto histórico e cultural. Cristãos japoneses, bolivianos e dinamarqueses adoram o mesmo Deus? Os cristãos norte-americanos do século 21 adoram o mesmo Deus dos monges irlandeses do século 7? Em cada um desses casos, há semelhanças e algumas diferenças nas respectivas compreensões de Deus, ainda assim reconheceríamos (tanto quanto se possa afirmar) que muitos desses, se não todos, estão adorando o mesmo Deus. A questão mais ampla, então, é a seguinte: (9) quanta variação no entendimento de Deus é aceitável quando dizemos que dois ou mais grupos estão se referindo ao ou adorando o mesmo Deus?[1]

Em geral, temos a tendência de acomodar algumas diferenças na compreensão de Deus entre as identificadas como cristãs, ainda que nem todas essas perspectivas sejam acuradas. A despeito de claras diferenças em certos pontos, reconhecemos que estamos nos referindo ao mesmo Deus.

Mas, quando a questão das diferenças de entendimento está além das fronteiras religiosas, estamos muito menos dispostos a reconhecer um referente comum. Diferenças a respeito da natureza de Deus entre pensadores cristãos é uma coisa, diferenças entre cristãos e muçulmanos é outra. De fato, há diferenças reais de crença entre muçulmanos e cristãos que não podem ser minimizadas.

A crença na Trindade serve como uma espécie de delimitador de fronteira para os cristãos; a rejeição da [Trindade] situa quem não a aceita fora da comunidade cristã ortodoxa. Manter fronteiras é essencial. Contudo, focar apenas em delimitadores tais como a doutrina da Trindade pode também obscurecer outros pontos nos quais muçulmanos e cristãos podem ter importantes pontos de acordo. Mais ainda, como cristãos, devemos nos lembrar que todas as pessoas, incluindo os muçulmanos, foram criadas por Deus portando a imagem divina, e assim devemos esperar uma medida de similaridade nas compreensões mesmo além das fronteiras religiosas.

Em nosso envolvimento missiológico com pessoas de outras religiões, incluindo os muçulmanos, devemos construir a partir do que temos em comum, encorajando todos a abraçar Jesus Cristo como Senhor, para que amadureçam em seu entendimento de Deus como revelado na Bíblia e para que o adorem de maneiras biblicamente apropriadas.[2]

[1] Essa questão deve ser distinguida daquela a respeito de quão claro e quão abrangente deve ser o entendimento que se tem de Deus para ser salvo. Essa é uma questão a respeito das condições necessárias e suficientes para a salvação, enquanto (9) trata da questão das condições sob as quais pode-se afirmar que dois ou mais entendimentos conceituais referem-se ao mesmo ser.

[2] Sou grato a Tom McCall por seus úteis comentários a respeito de um manuscrito anterior desse ensaio.

Bibliografia

FREGE, Gottlob, 1952: “On Sense and Reference”, Translation from the Philosophical Writings of Gottlob Frege, trad. Max Black & Peter Geach (New York: Oxford University Press)

WOODBERRY, J. Dudley, 2004: “Do Christians and Muslims Worship the Same God?”, Christian Century (May 18, 2004), p. 36-37.

Sobre o autor
Harold Netland é professor de Filosofia da Religião e Estudos Interculturais na Trinity Evangelical Divinity School.

 

Cristãos e muçulmanos adoram o mesmo Deus?

Roy Oksnevad

A resposta a essa pergunta é mais complicada do que parece ser a princípio. Por exemplo, de um ponto de vista apologético, tanto os muçulmanos quanto os cristãos diriam não. Tawhid é a doutrina central e definidora de Deus no islã. Essa doutrina declara um monoteísmo absoluto – a unidade e unicidade de Deus como criador e sustentador do universo. No cristianismo, a doutrina central e definidora é a Trindade. A Trindade afirma a unidade de Deus quanto à sua essência, mas três em pessoa – Deus o Pai, Deus o Filho, e Deus o Espírito Santo.

Da perspectiva de um diálogo inter-religioso, tanto os muçulmanos quanto os cristãos afirmam que creem no mesmo Deus. No entanto, eles reconhecem que seu testemunho a respeito de Deus diverge em pontos específicos.[1] (Veja figura 1.) Com frequência, os muçulmanos presumem que, quando estamos falando de Deus, queremos dizer Deus, que é apenas um, o criador, o amoroso, o justo, o santo e o misericordioso, o vivo e eterno, o sábio e onisciente.[2] Os cristãos se referem às áreas de sobreposição entre os dois credos, mas também reconhecem a revelação especial distinta de Deus tal como encontrada na Bíblia. Lamin Saneh escreve que a identificação de Alá com Deus “é adequada na medida em que admite que há apenas um Deus, mas inadequada com respeito ao caráter de Deus, sobre o qual se baseiam questões de comprometimento e identidade, e cuja negação cortaria nossos vínculos com Deus”.[3]

 

 

Muçulmanos que se converteram a Cristo também têm perspectivas mistas com respeito a quem eles adoravam quando ainda eram islâmicos. Alguns, quando se achegaram a Cristo, afirmaram que encontraram o Alá pelo qual buscavam, ou então que estavam procurando por Alá, mas finalmente o encontraram em Cristo. Outros afirmam que o Deus do islã é um Deus falso, e ele é a causa de todos os problemas no mundo muçulmano. O pai das missões modernas junto aos muçulmanos, Samuel Zwemer, declara: “Fora do Alcorão, Maomé foi silencioso com respeito à natureza do ser de Deus”.[4] Os grandes imãs cairiam em negações a respeito da natureza de Deus de acordo com o encontrado no ensino islâmico.[5]

O mundo no qual vivemos está caminhando para o que Don Carson chama de nova tolerância,[6] segundo a qual manter uma posição em particular que seja alinhada com um entendimento cristão é considerado como sendo “intolerante”. A pressuposição da nova tolerância é que nossa opinião deve promover o bem comum, ou apoiar o relativismo moral. Acredita-se que qualquer coisa menos que isso promova a intolerância, que [, por sua vez,] leva ao sectarismo ou a alguma percepção fóbica do “outro”. Torna-se uma resposta social em vez de uma resposta da verdade. Homens e mulheres de hoje não conhecem nada pior do que estarem cercados pelos preconceitos estreitos da ignorância e da intolerância racial.

Aos ouvidos sem discernimento, esse relativismo moral soa como um nível moral elevado; no entanto, isso dilui e homogeniza convicções e crenças a ponto de que sustentar algumas crenças tradicionais signifique ser intolerante. O impacto da modernidade e da globalização força os crentes em Cristo a repensar suas crenças religiosas que nunca foram desafiadas à luz do mundo glocal. A modernidade está forçando a religião a tomar uma posição secundária em relação ao que é percebido como sendo mais importante, ou seja, a agenda da resposta econômica ou social.[7] Particularmente nos Estados Unidos, os muçulmanos estão usando a islamofobia como um recurso para silenciar qualquer pessoa que queira apresentar o islã no que eles classificam como uma luz negativa.[8]

Quais são as implicações missiológicas de se afirmar ou negar que cristãos e muçulmanos adoram o mesmo Deus? Acredito que [essa] discussão tenha mais nuances do que afirmarmos ou negarmos que adoramos o mesmo Deus. Essa pergunta nos coloca numa dicotomia inclusivismo/ exclusivismo. A pergunta que deveria nortear a discussão é: os muçulmanos têm um entendimento pleno, parcial ou nulo de quem é Deus? Ou, então, os cristãos deveriam perguntar: minha reação ao entendimento muçulmano e cristão de Deus é formado pelas lentes de não querer ser acusado de intolerância? Ou está mais de acordo com a resposta de Jesus a Filipe, que pediu para ver o Pai: “Você não me conhece, Filipe, mesmo depois de eu ter estado com vocês durante tanto tempo? Quem me vê, vê o Pai. Como você pode dizer: ‘Mostra-nos o Pai’?” (Jo 14.9, NVI).

Como os cristãos deveriam responder à crescente presença e ao ressurgimento global islâmicos? Muçulmanos com quem interajo querem que os cristãos sejam cristãos. Os muçulmanos ficam frustrados quando se encontram com cristãos confusos quanto à sua identidade. Usar um hijab não manifesta solidariedade com muçulmanos que são vítimas de islamofobia, mas sim o reconhecimento da superioridade do islã. Jejuar como um muçulmano durante o Ramadã não expressa camaradagem para com os muçulmanos, desse modo abrindo mais oportunidades para compartilhar [sobre] Cristo. Em vez disso, transmite sinais confusos. No lugar de fazermos declarações que muçulmanos e cristãos adoram o mesmo Deus, algo que o Alcorão afirma em 29.46, deveríamos nos envolver em uma discussão rigorosa a respeito da autorrevelação de Deus tal como encontrada na Bíblia. Missiologicamente, queremos aproveitar cada oportunidade para compartilhar o Deus que entrou na história, revelou o Pai, e redimiu a humanidade.

[1] Kateregga, Badru D. e David W. Shenk, 1980. Islam and Christianity: A Muslim and a Christian in Dialogue. Grand Rapids: Eerdmans. Para uma discussão mais ampla, veja os capítulos 1 e 13, nos quais cada um discute o seu entendimento de Deus.

[2] Ibid., p. 88.

[3] Citado em Timothy Tennent, 2007. Theology in the Context of World Christianity. Grand Rapids: Zondervan, p. 38.

[4] Zwemer, Samuel, 1905. The Moslem Doctrine of God. Nova York: American Tract Society, p. 30.

[5] [(…) “Mohammed, outside of the Koran, was silent regarding the nature of God’s being”. The great Imams would fall back on negations concerning the nature of God as found in Islamic teaching.]
[6] Carson, D. A., 2012. The Intolerance of Tolerance. Grand Rapids: Eerdmans.

[7] Para uma discussão mais completa da modernidade e seu impacto na religião, veja Hitching, Bob. McDonalds, Minarets and Modernity. Cumbria: Spear Publications, 1996.

[8] Oksnevad, Roy. “Islamophobia”. 16 de março de 2015. Disponível em: http://commanetwork.com/dig_deeper/islamophobia/

Sobre o autor
Roy Oksnevad atua na organização ReachGlobal com Muslim Ministries [Ministérios Muçulmanos].

 

Pesquisa sobre os credos abraâmico: judaísmo, cristianismo e islã

Kurt Anders Richardson

A controvérsia evangélica norte-americana na apologética inter-religiosa passou a se dividir a partir da pergunta: cristãos e muçulmanos adoram o mesmo Deus? Mas, pelo fato de que essa questão passou a ser definida mais precisamente pelas doutrinas nucleares da fé cristã – cristologia, soteriologia, a Trindade –, podemos simplificá-la da seguinte maneira: cristãos e muçulmanos praticam a mesma adoração? Obviamente a resposta é “não”. Mas como essa questão foi formulada inicialmente?

De acordo com uma metodologia teológica estrita, levantar a questão da adoração é levantar uma questão litúrgica, confessional ou denominacional. De fato, a questão concernente à sobreposição das visões muçulmana e cristã de Deus não é uma questão de “adoração”, mas uma questão teológica e filosófica. A inadequação da questão da adoração se dá pelo fato de nela estar embutido um nível de julgamento muito elevado, que se conecta, por exemplo, a questões interconfessionais ou interdenominacionais de admissão ao sacramento, reconhecimento da ordenação e (as mais delicadas dentre todas) da fé salvadora. Definida dessa maneira, não se pode aplicar a credos distintos, ou então se torna uma questão mal colocada.

Em 2015, a questão soava apenas como uma filigrana confusa; mas agora, quando está causando prejuízo em múltiplos níveis, tornou-se verdadeiramente perniciosa, e não deve ser levantada. Na história das perniciosas questões religiosas, deve-se lembrar da resposta “Essa pergunta é tua…?” (Jo 18.34) – Jesus respondendo a Pilatos com uma pergunta. Nessa “pergunta sobre adoração” formulada por apologetas a fim de se obter vitória rápida em suas polêmicas rotineiras, todos saem feridos quando a pergunta é feita no contexto da fé e da missão cristãs.

Ao passo que esse caso apresenta uma quase equivalência entre “adorar o mesmo Deus” e “praticar a mesma adoração”, teólogos competentes podem reconhecer que se trata se um dos delimitadores mais difíceis de se estabelecer no sentido mais amplo. Em contextos confessionais estritos, “mesma adoração” significa que não católicos não são admitidos à eucaristia romana, wesleyanos não são convidados para púlpitos reformados, o batismo infantil não é reconhecido pelas igrejas batistas, e o celibato obrigatório para os sacerdotes é rejeitado pelos ortodoxos. Todas essas condições impedem uma “solidariedade não qualificada” entre os cristãos. E mesmo a vasta maioria de teólogos e clérigos cristãos que professam a ortodoxia, orientais e ocidentais, consideram os muçulmanos como tendo uma fé no mesmo Deus que os judeus e os cristãos. De fato, o Deus de Abraão é o ponto-chave de referência por trás da expressão que se tornou padrão – os credos abraâmico [ou religiões abraâmicas] –; torna-se uma espécie de pré-requisito ser teologicamente competente e simpático na compreensão do judaísmo e do islã a partir da perspectiva da fé cristã.

Estudiosos do judaísmo desde o tempo de Maomé consideram que os muçulmanos adoram o mesmo Deus, conquanto pertençam a diferentes credos. Esse é quintessencialmente o caso de Maimônides, o mestre medieval do judaísmo, que considerava os muçulmanos como “monoteístas perfeitos”. O que ele queria dizer com isso é que eles seguiam sem defeito a lei de Deus contra a idolatria.[1] No judaísmo, qualquer comunidade humana que vivesse de acordo com as “leis noaicas” de Gênesis 9-11, isto é, o monoteísmo essencial, era considerada como adoradora do mesmo Deus. Claro que a questão do ministério profético de Maomé não é aceita por Israel, mas, para os politeístas, a resposta era sim.

A rejeição do politeísmo como resultado da pregação de Maomé era, para os judeus, uma evidência de que a profecia tinha sido transmitida e ouvida pelos que se arrependeram de sua idolatria – algo análogo aos efeitos da profecia de Jonas aos ninivitas. De fato, por causa do rigor do monoteísmo muçulmano, o judaísmo permite aos judeus que orem com muçulmanos. Maimônides não se conformou com o fato de que os cristãos tinham Maomé em má conta, e percebeu calúnias nas caricaturas e na desinformação deles quanto ao islã; as declarações dos cristãos não deveriam ser respondidas, disse Maimônides, citando Pv 26.5.[2] Então, se os judeus estão em relacionamento pactual noaico com os muçulmanos e os cristãos, o que isso significa para os cristãos que mantêm uma relação de aliança com os judeus?

O próximo lugar para procurarmos por entendimento nas relações é entre as igrejas cristãs historicamente localizadas em regiões majoritariamente muçulmanas, particularmente as que usam a língua árabe ou alguma língua cognata do árabe em sua adoração litúrgica. Na Igreja Ortodoxa Síria, bem como na Igreja Católica Melquita Grega, cujas liturgias datam do sétimo século, a palavra para Deus é Alá. Todas as petições são dirigidas a Alá, o único Deus verdadeiro; Alá é Pai, Filho e Espírito Santo, é o Deus de misericórdia e graça.[3] Infelizmente, as comunidades cristãs orientais têm na prática tamanha exclusividade cultural que implica pouca visão missional para o mundo muçulmano ao redor delas. Isso acontece certamente por causa das hostilidades mútuas ao longo de muitos séculos.

Houve quem sugerisse que a revelação natural quanto à verdade do Deus único é a melhor abordagem para se identificar os pontos em comum entre cristãos e muçulmanos. Suas respectivas filosofias da religião têm alimentado uma à outra por meio de debates e apreciação mútua por séculos, e isso acontece até hoje.[4] Mas mesmo esse monoteísmo básico é mais do que a caricatura da apologética padrão muçulmana se dá conta. Filósofos muçulmanos da religião reconhecem uma divindade pessoal do teísmo. E, no nível da exegese, o Alcorão começa convocando a humanidade para recordar a misericórdia de Deus, cuja natureza é fundamentalmente misericordiosa. As tradições religiosas islâmicas são cheias de práticas legalistas, mas essas não são vitais para se experimentar a misericórdia de Deus de acordo com o Alcorão. Tudo isso tem sido debatido por teólogos competentes, do cristianismo e do islã, por séculos. As relações antigas entre os três credos revelam diálogos profundos sobre questões tais como os atributos divinos do único Deus verdadeiro.[5]

Evidentemente, o que é difícil é estar relacionado de forma próxima a um credo que tenha muitos pontos centralmente coincidentes – de fato, o Alcorão não pode ser completamente entendido sem um conhecimento detalhado da Bíblia, mesmo citando muitos erros que criam uma separação permanente. Não obstante, devemos evitar fazer caricaturas, ou perderemos o que os muçulmanos e seus eruditos estão dizendo: por exemplo, ter alegria no conhecimento de Deus.[6] Se a questão vai continuar a ser levantada, ela deveria ser entendida da forma como a maioria dos teólogos católicos e ortodoxos a têm respondido: “sim, mas”[7] – querendo dizer não em qualquer sentido litúrgico ou soteriológico. A missão continua; vamos banir o medo.

[1] Cf. Maimonides, Mishneh Torah, Hilchor Ma’achalot Asurot 11:7. Trad. Rabinowitz and Grossman. New Haven: Yale University Press, 1965.

[2] “(…) Não respondas ao tolo segundo a sua estultícia” – algo que nós cristãos evidentemente não queremos ouvir.

[3] Cf. Anaphoras. The Book of the Divine Liturgies according to the Rite of the Syrian Orthodox Church of Antioch [O Livro das Divinas Liturgias de acordo com o Rito da Igreja Ortodoxa Síria de Antioquia]. Ed. Metropolitan Mar Athanasius Yeshue Samuel. Lodi, N. J., 1991, p. 5-52.

[4] William Lane Craig. The Kalam Cosmological Argument. Eugene: Wipf & Stock Publishers, 2000.

[5] Cf. Sandra Toenies Keating, “Some reflections on the early discussions concerning the sifat Allah: cross-fertilization and cooperation in the Islamic milieu”, Islam and Christian-Muslim Relations, 22 (2011), p. 23-35.

[6] Cf. Brock Bingaman, “A Common Vision: John Cassian and AL-Ghazali’s Correlative Conceptions of the Spiritual Life”, Islam and Christian-Muslim Relations. 20.2 (2009), p. 171-182.

[7] Cf. Gavin D’Costa, “Interreligious prayer between Christian and Muslims”, Islam and Christian-Muslim Relations. 24.1 (2013), p. 1-14.

Sobre o autor
Kurt Anders Richardson é professor associado de Estudos Abraâmicos no Graduate Institute of Applied Linguistics.

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